quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Jornalista acompanhou de perto o resgate das vítimas

(Reprodução/Ilustração/Revista Veja 14/01/1981)
O jornalista Humberto Moreira, atualmente responsável pela editoria de esportes do jornal A Gazeta, acompanhou de perto o trabalho de resgate das vítimas.
Com mais de 40 anos de profissão, na época do naufrágio do Novo Amapá Moreira era chefe do departamento de jornalismo da Rádio Nacional, hoje Rádio Difusora de Macapá.
Leia na íntegra o depoimento do jornalista:
Na época do naufrágio do barco Novo Amapá eu estava na direção do departamento de jornalismo da Rádio Nacional. Um imprevisto ocorrido com o companheiro Paulo Silva, obrigou-me a embarcar no empurrador Pajé, na noite do dia 7 de janeiro, rumo ao local da tragédia. A notícia do naufrágio chegou a Macapá no começo da tarde do dia 7 de janeiro. Mas as informações eram muito vagas. Ninguém sabia ao certo quantas pessoas estavam a bordo do barco sinistrado. Havia um boato que dava conta que a Jari Florestal mandaria uma balsa para socorrer as vítimas. O governo demorou a tomar as primeiras providências. Só quando os primeiros sobreviventes chegaram a Santana foi composta a equipe de resgate. Na manhã do dia 8, chegamos ao local da tragédia do Novo Amapá. Parte do barco estava fora d’água, numa demonstração de que o pânico acabou matando muita gente naquela fatídica noite. O quadro era dantesco. Dezenas e dezenas de cadáveres boiando nas águas barrentas do Cajari, no lugar chamado de Ponta dos Aruans. No resgate estavam: o doutor Torrinha, um enfermeiro, sete soldados voluntários do Exército, três policiais militares e mais duas embarcações pequenas, (Dias e Colares) que traziam os corpos amarrados uns aos outros em adiantado estado de putrefação, exalando um odor que entranhava em nossas roupas. Um guindaste (pau de carga) manuseado pelos soldados, embarcou 192 cadáveres, empilhando-os na balsa uns sobre os outros. Foram dois dias de trabalho. Durante o dia, aviões atiraram frascos de formol no rio. A substância foi aplicada sobre os mortos sem fazer muito efeito. Caixas de leite em pó, carne em conserva e cachaça, eram jogadas no rio para que as voadeiras apanhassem. Os tripulantes do empurrador estavam constantemente embriagados, chorando nos corredores. Ninguém estava preparado para um choque daquele tamanho. O comandante Marapanin, totalmente transtornado, falava em atracar direto em Santana. Manoel Antônio Dias, na época secretário de Obras do Território Federal do Amapá, pediu a mim e ao médico Torrinha para não deixar o comandante trazer a balsa direto para o porto, onde milhares de pessoas esperavam nossa chegada. A Rádio Nacional teve um papel importante, informando o andamento do resgate. Utilizando o equipamento de comunicação da embarcação consegui passar mais de trinta flashes. Conosco um motorista que perdeu toda a família, procurava identificar seus entes queridos. Tudo em vão. No dia 10 de janeiro fundeamos na entrada do Rio Matapi, onde os corpos foram colocados nos caixões. Uma equipe veio do porto para auxiliar nos trabalhos. Mas ao chegar perto da balsa, muitos quiseram pular no rio, tal era a intensidade do odor e ainda devido ao quadro horripilante dos corpos empilhados uns sobre os outros. Quando saltei em terra permaneci alguns minutos perambulando pela área do porto, até que alguém me levou a uma barraca, onde fui imunizado. Um carro da Radiobrás me trouxe para Macapá. Ao chegar na minha casa fiquei mais de uma hora tomando banho. Porém parecia que o mau cheiro continuava presente. Ele estava dentro de mim, nos meus pulmões. Por fim consegui dormir, depois de 72 horas sem pregar os olhos. As imagens, infelizmente continuam gravadas em minha memória. Trata-se da reportagem que eu nunca gostaria de ter feito. (Humberto Moreira).
(Texto extraído do Portal de a Gazeta-AP - 06/012011)

Fonte: Portal A Gazeta-AP

Um comentário:

  1. Humberto, aqui é gilmar capixaba, fui atleta do trem nos anos 70, infelizmente, estava nesta época desde triste acidente, o qual até hoje guardo, na memória cenas lamentáveis, não sabia que tinha feito, este trabalho, pois você, sempre trabalhou mais voltado para o futebol, lembro muito da sua narração, quando eu jogava no trem, e seleção amapaense juvenil, parabens pela sua carreira, um grande abraço, em todos amigos de macapa, em especial ao JOÃO LÁZARO,

    ResponderExcluir

MEMÓRIA DA SEGURANÇA PÚBLICA AMAPAENSE - DR. HILDEBERTO CARNEIRO DACRUZ - DELEGADO

Hildeberto Carneiro da Cruz veio ao mundo em 17 de novembro de 1947, na cidade de Belterra/PA . Após concluir o curso de direito em Belém ,...