O Complexo Esportivo e Espaço de Convivência “Rosival Gil Brito de Souza (Bonde), recém inaugurado em Macapá, na Praça N.S. da Conceição, homenageia um destacado desportista local. Vamos conhecer uma pouco da história desse pioneiro.
Rosival Gil Brito de Souza, conhecido como “Bonde”, nasceu em 22 de fevereiro de 1937, filho de Manoel Brito Ferreira e Eulália Gil de Souza. Era natural da cidade de Vigia-PA, mas amapaense de coração. A sua adoção pelo Amapá começa no final dos anos 40, prestes a completar 13 anos de idade, quando, como ajudante de seu pai, Manoel Brito, pescador profissional, singrou as águas do amazonas em um barco a vela, partindo de Vigia-Pará até Calçoene-Amapá, para a pesca da gurijuba, peixe que, após ser capturado nas águas do norte do estado do Amapá, era comercializado no estado do Pará. Nos anos seguintes, idas e vindas se sucederam na mesma rota de viagem e trabalho, quando em uma delas, Rosival “o Bonde”, já com 16 anos de idade, enamorou-se por uma jovem chamada Creuza, nascida em Calçoene e filha de família de pequenos criadores de gado. Casaram logo e estabeleceram residência em Macapá, ele com 17 e ela com 15 anos.
Do casamento nasceram dez filhos, seis homens e quatro mulheres: Nelson (o primogênito), Rosenilda, Rosemeire, Jorge, Edilson, Ronaldo, Roseneide, Ronildo, Roselene e Romildo (o caçula), todos macapaenses. A vida lhe concedeu, ainda, 18 netos e 15 bisnetos. Rosival “o Bonde”, ao se fixar em Macapá e já afastado da pesca, cumpriu uma jornada longa de feitos que a deixou consignada, assim como tantos outros homens e mulheres na história do pioneirismo do Amapá. Em Macapá, fixou-se com a sua família e foi morar no bairro do Trem, sempre às proximidades da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. Na paróquia, foi integrante do Apostolado de Oração, coordenador da comunidade São Benedito e participou ativamente dos eventos religiosos e das festividades realizadas pelos paroquianos. Dedicou sua fé e devoção aos seus filhos na iniciação e formação cristã católica. Foi um participante ativo na agregação das festividades de Nossa Senhora das Neves, padroeira dos vigienses, ao espaço físico da Igreja da Conceição, que até hoje acontece, e neste ano (2024) completam 79 anos de festividade em Macapá. Foi presidente por mais de 20 anos alternados da Colônia, e posteriormente, Associação dos Vigienses Radicados no Amapá, entidade que em tempos passados agregava as centenas de vigienses que residiam no Amapá. Foi graças à sua capacidade de liderança e convencimento que durante o governo Anibal Barcelos, foi estabelecido um ponto facultado para todos os vigienses que trabalhavam no governo e que residiam no Amapá, para que pudessem participar, durante todo o dia, das comemorações alusivas à festividade de Nossa Senhora da Neves, celebrada anualmente no dia 5 de agosto, que naquela época era um evento bastante concorrido, e que incluía, além da procissão, o prato e o bolinho de gurijuba servidos para todos, inclusive para as autoridades, os arraias, os leilões, e finalizava com grandes bailes para os vigienses. Liderou juntamente a seus pares o movimento com doações e ofertas que resultou na construção em madeira da primeira sede da Associação dos Vigienses Radicados no Amapá, edificada no bairro do Trem, e da segunda sede em alvenaria, e, finalmente, junto ao Governo do Estado, na década de 80 a última sede da AVRA, destinada à convivência e assistência dos vigienses residentes no Amapá. Na sua época, a comunidade vigiense no Amapá era, em número absoluto, a segunda maior, perdendo apenas para os próprios amapaenses nascidos ali. Daí a estreita ligação e o pioneirismo dos vigienses com o Amapá, que se expandiu através dos seus descendentes. Não por acaso, a Banda da Guarda Municipal de Macapá é composta por diversos músicos vigienses. No início da constituição da sua família, Rosival “o Bonde” desempenhou uma atividade diversificada, dedicando-se a sustentá-la e assegurar um futuro digno para os seus filhos, sem medir esforços desde que os diversos ofícios dos quais se incumbiu fossem honrados. O seu primeiro emprego fixo em Macapá, no final dos anos 50, foi como cobrador dos primeiros ônibus que surgiram na cidade, aqueles que mesclavam lataria e madeira no seu revestimento, os quais só funcionavam após diversos giros manuais da manivela que o motorista ou o cobrador faziam na parte frontal do veículo. Em seguida, valeu-se da sua condição de jovem jogador de futebol, desde os tempos em que viveu na Vigia, para ser chamado a jogar no time do Santana Esporte Clube (o canário milionário como era conhecido), isso rendeu-lhe um contrato para trabalhar na Indústria e Comércio de Minérios S/A-ICOMI. Na ICOMI trabalhou cerca de dois anos, tendo ainda com a influência de jogador de futebol, se tornado funcionário do Governo do extinto Território Federal do Amapá, onde 30 anos depois se aposentou.
Além do Santana Esporte Clube, em Macapá jogou também no Guarany Atlético Clube, convidado por seu compadre Milton Corrêa, que era o dono do Clube. De acordo com os registros históricos do saudoso jornalista Joaquim Neto, Rosival (o Bonde) foi o primeiro treinador do Clube da Torre, agremiação tradicional fundada em 1963 sob a inspiração da paróquia de Nossa Senhora da Conceição.
Também dirigiu o Municipal Esporte Clube, extinta agremiação da Prefeitura Municipal de Macapá que, na década de 1960, disputou o campeonato amapaense da primeira divisão do Amapá. Foi fundador do Clube Atlético Londrina, que disputou o campeonato profissional nos anos 90 e hoje está licenciado da Federação Amapaense de Futebol. A sua veia de desportista oportunizou a formação de dezenas de jovens bons jogadores, craques dos áureos tempos do futebol amapaense.
A praça de Nossa Senhora da Conceição foi o seu principal instrumento laboratorial para os muitos feitos em favor do desporto amapaense. Rosival, “o Bonde”, com uma enxada e um ancinho, foi o construtor do segundo campo oficial da praça de Nossa Senhora da Conceição, que no passado era composto por quatro campos de futebol, onde eram realizados treinamentos dos clubes locais, torneios e campeonatos com a sua frequente participação e idealização.
Dando continuidade à sua luta para construir o futebol amapaense, em 1991, no estádio Zerão, viu uma obra construída por suas mãos: os seus seis filhos jogarem juntos em uma partida oficial de futebol profissional, vestindo o mesmo uniforme e defendendo as cores do seu time querido, o Clube Atlético Londrina, o que resultou num feito inédito no mundo do futebol até que se prove o contrário. Esses traços de liderança e alegria o fizeram também um dos principais líderes na história super vitoriosa da Escola de Samba Piratas da Batucada. Em 1987, ele, juntamente com os mestres Monteiro e Manoel Torres, e o filho Nelson Souza, foi um dos responsáveis pela união das instituições existentes no bairro do Trem, fazendo da Piratas da Batucada uma escola Super Campeã, que passou de zero título para dezenas de conquistas. Além disso, emprestou a sua inquietude saudável para ser um dos fundadores do movimento junino Bate Coração, que resultou na conquista de diversos títulos em festivais juninos. Rosival Gil Brito de Souza, o Bonde, era um homem alegre, festivo, folclorista e idealizador. Sempre dizia que, perto dele, não havia espaço para a mediunidade e a tristeza, apenas para a atitude e a animação. Faleceu em novembro de 1993, aos 56 anos, deixando um legado de bons exemplos para ser seguido. Seu corpo descansa em paz no Cemitério de São José, bairro Santa Rita.
NOTA DO EDITOR
Agradecemos a colaboração do amigo Nelson Souza, um dos filhos de homenageado, pelo envio do texto biográfico, informações complementares e fotos de seu pai Rosival Gil Brito de Souza, o Bonde! João Lázaro.