segunda-feira, 30 de maio de 2011

Especial: O "popular" Bar Caboclo

"O Bar Caboclo nunca serviu como pista de dança e muito menos chegou a ser hospedaria de prostitutas."
O Bar Caboclo foi um ambiente comercial que se tornou conhecido na Macapá de outrora (década de 60), com suas histórias e boemias, que serviram de inspiração para a montagem de consagrada peça de um dos grupos de teatro do Amapá.
Seus frequentadores eram caboclos vindos das ilhas do Pará, nas embarcações que aportavam na Doca da Fortaleza, trabalhadores da ICOMI e da Usina Coaracy Nunes, no Paredão. Nessa época os estilos musicais eram o bolero, o samba e o merengue, por influências das Antilhas e da Guiana Francesa. Haviam também as figuras femininas que marcavam ponto no local.
Você vai conhecer agora, a reprodução (com as devidas adaptações e atualizações) de uma matéria publicada em 1995, pelo jornal Folha do Amapá. O texto é assinado por Cláudio Mendes:
A VERDADEIRA HISTÓRIA DO BAR CABOCLO
Bastou apenas a decisão de um comerciante para que uma história de mais de quatro décadas chegasse ao fim e deixasse estampada a tristeza no rosto de seus protagonistas.
(Foto: Reprodução de jornal/Arquivo Rogério Castelo)
O popular Bar do Chico, localizado na esquina da rua São José com a avenida Mendonça Júnior, foi demolido em 1995, para dar lugar à uma edificação moderna (foto mais abaixo).
Com isso, o que restava da memória viva do velho Bar Caboclo deixa de existir e a esquina da boemia passa a ser a esquina da saudade.
Local de mulheres extrovertidas e homens valentes, o Bar do Chico era o único sobrado de madeira no centro comercial da cidade que vinha resistindo ao progresso. O ambiente era movimentado de domingo a domingo e no período de pagamento a freguesia aumentava. Todos sabiam que naquele velho sobrado a profissão mais antiga do mundo ainda podia ser exercitada à moda antiga.
Como nos velhos tempos em que se usava o palavreado “cabelo, barba e bigode” para deixar subtendido que as prostitutas topavam tudo com o freguês. Resumindo, o Bar do Chico era, de fato, resquício do Bar Caboclo, cuja história ninguém conta melhor que seu próprio fundador, Abrão Serrão de castro. Na época, aos 73 anos de idade (Jornal de 1995), ele relatou o quanto foram importantes para ele aqueles anos boêmios.
O INÍCIO DA HISTÓRIA
No final dos anos 40, um homem vindo da cidade de Mazagão Velho resolveu montar um negócio. Comprou a área onde funciona atualmente a sede do Sindicato dos Bancários e lá montou uma venda, construída em madeira. Um ponto comercial simples, porém, bem equipado. Lá tinha confecções, picolé, sorvete, produtos alimentícios, suco, refrigerante, aguardente e um nome sugestivo: Bar caboclo. Abrão havia despertado a atenção do povo de uma simples cidade onde quase não havia entretenimento e tudo era novidade.
(Foto: Reprodução/Arquivo)
O bar ficava em área alagada, onde pontes de madeira serviam como passarela para o vai-e-vem dos dias e das noites.
O novo ponto comercial da cidade foi visto como uma mina de ouro por mulheres que sobreviviam da prostituição. Não havia local melhor na cidade para se conseguir fregueses. Ali próximo atracavam todas as embarcações que chegavam à Macapá trazendo caboclos ribeirinhos e também marinheiros estrangeiros que ao desembarcarem faziam logo procuração pelo bar.
De acordo com Abrão, o Bar Caboclo nunca serviu como pista de dança e muito menos chegou a ser hospedaria de prostitutas. Segundo ele, o que não faltavam eram quartos naquelas imediações para que elas desenvolvessem suas atividades.
“Eram apenas minhas freguesas. Me davam certo problema porque afastavam outro tipo de freguesia. Mas não poderia proibí-las de entrar no bar, mesmo porque elas também me davam lucro”, contava pensativo.
O proprietário do bar tinha lucro com as prostitutas porque quando um freguês se engraçava com alguma delas não tinha pena de esbanjar dinheiro. Abrão cita um costume das frequentadoras de seu bar: “Adoravam pedir para os caboclos pagarem cerveja para elas e me diziam no ouvido para eu esquecer a bebida e entregá-las o dinheiro mais tarde. Nunca gostei disso”.
Quando os marinheiros não tinham dinheiro para pagar o serviço de bar e o serviço das mulheres, sempre deixavam joias para cobrir a dívida. Abrão exibiu, durante a entrevista, um anel que recebeu de um gringo. Quanto aos caboclos, esses, quando não tinham dinheiro para cobrir suas despesas, o dono do bar até que aceitava um pagamento posterior. Mas com as prostitutas não tinha acordo. A pancada comia no centro e a Guarda Territorial entrava em ação.
O bar enfrentava outros problemas. Macapá era abastecida de energia das 22h até às 6 da manhã. Por determinação da Guarda Territorial o ponto poderia funcionar apenas até a meia-noite. “Era a época em que tínhamos como Governador Evanhoé Gonçalves Martins e havia um delegado de polícia chamado Ismar Leão que não dava mole. Ninguém ficava fora de casa depois da meia-noite”, enfatizava Abrão.
UM NOVO BAR
O ponto comercial de Abrão deu certo e em três anos ele inaugurou um outro bar, todo em alvenaria, muito mais equipado e pintado em cor rosa.
(Foto: Reprodução/Arquivo)
Prédio do extinto Bar Caboclo que localizava-se da esquina da Rua São José com a Av. Mendonça Jr. (a mesma do canal). No local - ampliado e adaptado - funciona hoje um mini-box explorado por um dos filhos do proprietário, pois o prédio é patrimônio da família.
No seu interior tinha uma gravura, de um casal de índios, feita pelo pintor Herivelto. Era um prédio, segundo Abrão, bastante chamativo. Haviam poucos como aquele na cidade. O empreendimento mudou de cara e de local, mas o nome permaneceu o mesmo.
Agora o bar caboclo passava a funcionar onde está localizada atualmente (2011) um Mini Box. A freguesia aumentava mais ainda. Em menos de uma hora de funcionamento o comerciante conseguia vender quase quatro grades de cerveja. O bar já era frequentado até por pessoas consideradas da “alta”, mas alguns homens não admitiam que suas mulheres pisassem no local. Há um antigo comentário de que um radialista da Rádio Difusora de Macapá chegou a ir buscar sua esposa aos tapas na porta do bar. Ali também era considerado o ponto da fofoca. Depois de alguns copos de cerveja, os homens costumavam fazer comentários sobre os casos de adultérios da cidade. Outro assunto de mesa de bar era virgindade. Todos pareciam saber quais as garotas que eram e as que não eram virgens.
(Foto: Reprodução de jornal/Arquivo Rogério Castelo)
Nas fotos (acima e abaixo à esquerda), na cerimônia de discerramento da fita, o casal Jacy Barata Jucá e sua esposa Dona Alice de Araújo Jucá.
(Foto: Reprodução de jornal/Arquivo Rogério Castelo)
Com o passar dos anos foram aparecendo outros estabelecimentos comerciais na cidade como as boates Merengue e Suerda. Como tudo o que aparecia em Macapá era novidade, essas casas chegaram a roubar a freguesia do Bar Caboclo. A Suerda funcionava como prostíbulo e suas prostitutas tinham fama de ser bonitas. Muitas vinham de outros estados para disputar o mercado com as amapaenses do Bar Caboclo. Mas essa concorrência não foi fato para prejudicar o sucesso do ponto comercial de Abrão. As frequentadoras do bar caboclo não inflacionavam o preço de seus serviços e recuperavam seus fregueses.
Seria um erro falar sobre o ponto comercial de Abrão sem citar que o bar era uma espécie de reduto dos literatos e jornalistas da época. Muitos deles não iam para o bar com intenção de pegar uma prostituta e levar para um quarto. A movimentação de ir para a cama com alguma prostituta, as brigas, o comportamento de quem olhava o movimento de fora, a fofoca, enfim os intelectuais sabiam que estavam frequentando um ambiente que ia entrar para a história do Amapá.
O poeta Isnard Lima declarou, em um artigo que escreveu para um jornal de Macapá, que foi no Bar caboclo que foi acometido de sífilis pela primeira vez.
O FIM DO BAR
Abrão diz que com o aparecimento do Plano Cruzado ficou sem condições de trabalhar devido à crise financeira.
“A crise me pegou de jeito e tive que fechar o negócio”, lamentava. O velho Bar Caboclo foi alugado então ao comerciante Edivar Juarez que lá montou a loja Discão Sucesso. Foram anos de trabalho insuficientes para dar a Abrão a vida de homem rico. A história do bar Caboclo hoje é enredo de peça teatral. O que não é de agrado daquele que foi proprietário do bar. “Ninguém veio me procurar para saber da história. Tudo foi desvirtuado e é compreendido como fato verídico. Isso não poderia ter acontecido”, enfatizava.
Na época da entrevista (1995) Abrão residia na avenida Iracema Carvão Nunes, em frente a caixa Econômica. Dividia uma casa simples com uma filha de criação e a esposa, Mirian Fonseca de Castro, que trabalhou também no bar, ao lado do marido, e na época (95) vivia em uma cadeira de rodas compartilhando com Abrão as memórias dos velhos tempos.
Com o fechamento do bar caboclo, as prostitutas passaram a frequentar o Bar do Chico que dificilmente era chamado pelo nome. As pessoas sempre se referiam ao ponto como se ali fosse o bar caboclo. O sobrado foi demolido para a construção de uma loja comercial. As prostitutas nada puderam fazer para evitar o fechamento. Mas prepararam uma feijoada para dar adeus a uma história onde foram as personagens principais. (Pesquisa de Rogério Castelo - blogueiro do Amapá)
Fonte: Matéria extraída do blog Amapá, minha amadaterra!!!, postada em 27 de maio de 2011, por Rogério Castelo, devidamente editada, adaptada e atualizada para ser reproduzida no blog Porta-Retrato.

7 comentários:

  1. Bom dia! agradeço a referência ao meu blog..saiba que curto e pesquiso muito o seu..fique a vontade para postar outras coisas que encontrar lá...tem umas fotos de trabalhadores da ICOMI na decada de 60,são fotos de familia, meu pai era mecanico lá, se quizer pode postar também

    roério castelo

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  2. Acabo de descobrir que minha mãe é afilhada de seu Abraao e dona Merian( JÁ FALECIDOS), lendo as publicaçoes, que tratei de reproduzir em meu blog...Obrigada pela bela pesquisa.WWW.BLOGDANEL.BLOGSPOT.COM

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  3. O Chico do Bar do Chico citado nesse artigo e meu avô, e ele ainda esta vivo e nora no laguinho meu whats 991017731 Daniel se quiser contato com ele pra pedir mais informações sobre histórias que ele viu e viveu.

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  4. Oi amigo boa noite sou neta do Ramiravéis filha do ramiro filho mas conhecido como Santos que saia na Caroça na Banda se caso tenha fotos dele por favor poste aqui pois foram 15 anos que ele acompanhava a Banda em sua caroça levando os remédios da moçada kkkkk ficarei grata

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  5. Excelente a matéria!
    Soube de fatos que desconhecia.
    Parabéns João e Rogério.

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