E lá se vão mais de setenta anos desde o dia em que Claudomiro Moraes
ancorou seus sonhos na terra dos Tucujus. “Seu Zito Moraes”, como passou a ser
conhecido pela gente do lugar, era uma pessoa carismática. Afável, bem
humorado, amigo de um bom papo, instrução básica. Um autodidata e boêmio
emérito, não dispensando nunca uma ou outra rodada da boa pinga nos botecos da
moda, com preferência aos mais democráticos onde a frequência permitisse
confraternizar, sem discriminação, com todos os níveis da representatividade
social, política e econômica da época.
Foi assim que Zito Moraes construiu sólida liderança na pequena cidade
onde capitaneou dezenas de campanhas políticas e amargou igual número de
memoráveis derrotas, por conta dos bizarros expedientes eleitorais praticados à
época pelos donos do poder que, entre a violência e o terror, “emprenhavam”
urnas substituindo as cédulas da oposição por votos de seu interesse. Era assim
que funcionava. A oposição nunca saia vitoriosa. Nunca.
Assim, sucessivamente derrotado nas contendas eleitorais, Zito Moraes
passou por humilhações terríveis, entre prisões gratuitas, perseguições
inomináveis e até apedrejamento de sua própria casa.
Antes, próspero comerciante, Zito Moraes morreu dignamente pobre. No
último leito não lhe faltou o afago das mãos enrugadas de Dona Dica, sua
mulher, que, altiva, resistiu e sobreviveu a tudo com a dignidade das grandes
mulheres que comungam dos ideais de seus homens e com eles compartilham os bons
e maus momentos “até que a morte os separe”.
Foi uma vida inteira perseguindo os ideais das mudanças, da democracia,
da liberdade, da cidadania e da alternância do poder que não viu acontecer. A
morte chegou antes.
Em
1970 articulou, já no MDB, o lançamento de uma força jovem para enfrentar o
todo poderoso caudilho Janary Nunes - velha raposa política que dominou por
longas décadas com a família os destinos do então Território do Amapá.
O
MDB ganhou as eleições e Antônio Pontes, o candidato, entrou para a história
como o primeiro político a vencer a oligarquia Nunes no Amapá.
Mas
Zito Moraes não comemorou essa lendária vitória e nem foi às urnas nas eleição
que enfim venceria. Morreu dia trinta de outubro, dezesseis dias antes do
pleito.
Consta que, no fervilhar da campanha eleitoral, Zito Moraes, já
internado no Hospital Geral de Belém, no Pará, enfermo e privado de quase todos
os seus sentidos, apenas falando e ouvindo com dificuldade, chamou o filho mais
novo e, sussurrando, pediu-lhe notícias da campanha: se seu partido e seu
candidato ganhariam ou não as eleições.
A resposta foi um entusiasmado SIM. Nesse instante foi possível perceber
naqueles lábios contraídos pela dor da enfermidade um enigmático e derradeiro
sorriso. Esse foi o último ato político de Claudomiro (Zito) Moraes.
Zito Moraes não viu nem festejou a vitória dos seus ideais, é verdade.
Mas é verdade também que, partindo prematuramente, pelo menos se privou de
frustrações maiores, como a de assistir aos descaminhos dos interesses que hoje
pontificam o exercício na política no país e no Amapá, onde a honra, a
seriedade e o compromisso com os interesses comuns são cada vez mais raros.
E
hoje fico imaginando seu Zito Moraes, depois de sua grande e última viagem,
aportando no cais do Paraíso e
perguntando a Pedro: Aqui tem governo? (Euclídes Moraes)
Nota do Editor: Texto escrito há 8 anos
(mais ou menos) pelo radialista/jornalista amapaense Euclídes Campos de Moraes,
sobre seu pai Claudomiro Moraes, que foi Prefeito Municipal de Macapá em dois
períodos: o primeiro de março a agosto de 1951 e o segundo de novembro de 1952
a 31 de dezembro de 1954.
O Mercado
Central foi construído na gestão dele, em 1952.
meu vô, minha familia
ResponderExcluirQ legal a história do meu vô,o papai se e parece com ele.
ResponderExcluir