sexta-feira, 2 de outubro de 2015

De Igarapé Açu até o Amapá: A Saga de um Pioneiro - Raimundo Cardoso Rodrigues (Badico)

O pioneiro Raimundo Cardoso Rodrigues nasceu em 29 de janeiro de 1926, em Igarapé Açu/PA, filho de Teófila Maria de Lima e José Rodrigues de Lima. Desde a infância ganhou o apelido de “Badico”. 
Sua profissão foi ourives, artesão que trabalha na fabricação, limpeza e conserto de joias. Desde cedo ele começou a trabalhar na profissão, tendo sido aprendiz de um garimpeiro e ourives, amigo da família, que veio do Nordeste.
O primeiro casamento aconteceu aos 19 anos em Belém, quando saiu da pequena “Igarapé Açu” para tentar o mercado da capital do Pará. Depois de alguns anos, se separou da primeira esposa, com quem teve três filhos: Odaisa, Osmar e Carmen. 
Nas idas e vindas para a região de garimpo, voltou a “Igarapé Açu”, morando na casa de tios, entre eles Irineu de Paula e Maria do Carmo Paula (dona Maroca), e aí surge uma linda história de amor entre uma prima, de nome Maria de Lourdes Paula, mais conhecida como Lourdes. Por serem primos legítimos, a família não apoiava a união deles. Depois de muita insistência, e após a morte do tio Irineu, de complicações sérias de saúde, e em razão deles estarem sempre se encontrando às escuras, a tia Maroca, mãe de Lourdes, resolveu aceitar. Assim, Badico e Lourdes passaram a constituir uma família.

Em 1953, chegaram ao Território do Amapá,  fixando-se na região de garimpo, entre os municípios de Amapá e Calçoene. A primeira filha do casal a nascer foi Dinair, no município de Amapá, em janeiro de 1954. Após dois anos, resolvem fixar residência em Calçoene, e tentam legalizar o casamento, mas a Igreja Católica (assim como acontece até hoje) não permitiu. Em 1955 nasce seu segundo filho: Edgar. Em 1957 nasce o Mair, e dois anos depois, cansados de ganhar a vida (ele em consertos de joias e ela em corte e costura) no interior, resolvem ir para a capital, Macapá, a convite de um abastado comerciante, na época, chamado Abraão Peres, dono de um casarão que ficava situado na Rua São José entre as avenidas Presidente Vargas e Coriolano Jucá. Assim começou a terceira fase de suas vidas.
Neste endereço, que dividia entre residência e ourivesaria, ao lado de um escritório de contabilidade do Sr. Wilson Carvalho, a família De Paula Rodrigues começou, a partir de 1959. Montada a ourivesaria, por sinal bem localizada na Praça Veiga Cabral, as crianças foram crescendo, matricularam-se na Escola Paroquial São José, e assim dividiam a vida entre trabalho, obrigações religiosas na Igreja Matriz de São José, onde até 1963 o padre ficava de costas, e a missa era celebrada em latim.

De repente chegam o pai de Badico e sua mãe, do Pará, para morar com ele, e em seguida seu avô, Zacarias Rodrigues Teixeira, que estava só em Uruburetama, no Ceará, e com idade avançada, foi morar com o neto. Em 1964 eclode no Brasil o sangrento Golpe Militar, com perseguições aos opositores, e no Amapá não poderia ser diferente. 
A região entre a Praça Veiga Cabral e a Fortaleza de São José era sempre palco de prisões de cidadãos, uns sendo confinados na antiga cadeia, na Av. Presidente Vargas perto da ourivesaria do Sr. Badico,...
Imagem meramente ilustrativa
...outros nos porões da Fortaleza de São José, e outros declarados “inimigos contumazes da Revolução”, sendo transferidos para Belém, para submeter-se a seções de torturas. 

Um pouco preocupado com esse quadro todo, Badico é aconselhado, por um de seus primos, a passar uma temporada em Santarém; pegou toda a família e resolveu se mudar para uma casa próxima à Igreja de São Raimundo Nonato; mas dona Lourdes não se acostumou, e pediu peremptoriamente para voltar para a casa. Nesse tempo, um rapaz, aprendiz do Sr. Badico, de inteira confiança, chamado Manassés Viterbino (futuro pai do Eliezer Viterbino, proprietário da Benoliel), resolve ficar um pouco com o seu “patrão” em Santarém, e dona Lourdes volta à sua Macapá querida, com todos os seus filhos. Mas não demorou muito para que o “chefe da família” retornasse, com saudades de seu lindo amor. Assim retornam ele e Manassés.
Em agosto de 1967 Badico consegue um local, na Rua Candido Mendes, em frente a uma sorveteria do Sr. Pinho, e ao lado do armazém do empresário Lavoura e da loja Flor da Síria, de  Rafik Char, de nacionalidade libanesa. 
Em 29 de novembro desse mesmo ano, após ser comemorado o aniversário da dona Lourdes, todos foram dormir, e se acordaram na madrugada com toda a quadra da rua pegando fogo. 
Toda a família saiu com a roupa do corpo, e o que puderam salvar, os saqueadores de plantão levaram. 
Novamente a família De Paula Rodrigues passou por grandes apertos, e o Rotary Clube, na época, sob a direção do Casal Genésio e Líbia de Castro, resolveu fazer uma tarde dançante na então Piscina Territorial, para conseguir verbas com fins a comprar todo o material de ourivesaria do “seu Badico”. Assim a família, também amparada pela comunidade de Macapá e pela Associação Comercial, tendo como líder o empresário Stephan Houat, conseguiu se recuperar de mais dessa. Assim os anos foram passando, e os filhos chegaram ao numero de 8: Dinair, Edgar, Mair, Pedro, Ray, Aldemir, Suely e Claudemir. 

Em 1974, cansada de tanto pagar aluguel, dona Lourdes, reúne os filhos para cada um colaborar na construção da casa. A filha mais velha, Dinair, consegue na Prefeitura de Macapá uma documentação provisória, comprando, a duras prestações, madeira e material de construção numa madeireira conhecida em Macapá. Apesar das dificuldades, a casa foi construída, cada um ficou com seu quarto, e o terreno documentado. E aos poucos, a vida ficou um pouco mais folgada. Em 1989 mais uma tragédia atingiu a família: a morte do caçulinha Claudemir Rodrigues, aos 21 anos, e muito querido por seus colegas policiais. Depois de sucessivos AVCs, e de um enfisema pulmonar provocado pelo vicio compulsivo do cigarro e pela utilização inadequada, desde os 18 anos, de ácidos corrosivos que eram utilizados na limpeza de joias sem máscaras e gorros, o chefe de família é declarado incapaz e os filhos assumem os destinos da casa. A morte do “seu Badico” ocorreu em 14 de fevereiro de 2000, por várias complicações, aliadas ao enfisema pulmonar e ao Mal de Alzheimer, chegando a ter vários AVCs (Derrames cerebrais). Dona Lourdes, que também padecia de dois AVCs e do enfisema, não aguentando a solidão provocada pela saudade do marido, veio a falecer dois meses depois, em 14 de abril.

Guerreiro, superprotetor dos filhos, e trabalhador incansável, “seu Badico”, diante dos limites que a vida lhe impunha, conseguiu criar toda a prole. A comunidade sempre o respeitou pela sua profissão, e pelos bons exemplos que dava à manutenção da família. No momento ele descansa, no “andar de cima”, juntamente com a “dona Lourdes”, mas seus exemplos permaneceram nos filhos, que hoje, a maioria, entrega também o comando à terceira geração. Dos oito filhos, dois já partiram também (Claudemir e Aldemir) e estão vivos: Dinair, Edgar, Mair, Pedro, Ray e Suely).

Portanto, essa é a Saga de seu “Badico”!

Texto de Edgar Rodrigues, com adaptações para o Porta-Retrato.
Fonte: Imagem Tripadivisor

Um comentário:

  1. Me sinto sem palavras, por esta linda homenagem que o meu amigo João Lázaro fez à minha familia. Muito obrigado mesmo...Um dia vou contar a historia de meu pai em um livro....

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