PREOCUPAÇÕES
DA CORTE:
Sucuriju,
o Rei Momo ainda sem sucessor.
O reinado
do Carnaval do Amapá continua vazio. O mesmo ocorreu com a morte de Sacaca em 1999,
aos 73 anos de idade.
Somente em
2003 é que Sucuriju ocupa o trono. Um vazio inexplicado.
CADÊ O
REI?
Texto: Édi
Prado e João Lázaro
Quem é o
Rei Momo?
O querido personagem, rechonchudo e irreverente é
historicamente o rei do Carnaval. “A ele são entregues, simbolicamente,
as chaves da cidade pelas mãos do prefeito. A partir daí está aberto o reinado
da folia, onde Momo reina absoluto até a Quarta-Feira de Cinzas.
Isso em todas as esferas da sociedade, já que ele próprio é a personificação do
Estado”, explica Augusto Neves, professor e doutor em história.
Origem da personagem
A origem remete ao tempo da Antiguidade Clássica, mais
especificamente à mitologia grega. Pouca gente sabe, mas Momo, na
verdade, era uma deusa. Filha de Nix (divindade do sono) era a
personificação do sarcasmo, reclamação e delírio, patrona dos poetas e
escritores. Ela era representada usando uma máscara e balançando guizos. Por
seu jeito irônico, acabou sendo expulsa do Olimpo.
Não se sabe ao certo em que momento houve a mudança de gênero
do personagem. “As representações sofrem transformações ao longo do tempo.
Mediante o contexto de um paradigma patriarcal, melhor seria um homem para
representar as relações de poder”, explica Rúbia Lóssio, socióloga, escritora
folclorista e professora e membro da Organização Internacional de Arte Popular
e Folclore (IOV).(uninabuco)
Pela carência de material de pesquisas a respeito do Carnaval
Amapaense, ainda não encontramos catalogados os Reis Momos de Macapá.
Sabemos que o carnaval começa a partir de 1943, quando o Amapá é
desmembrado do Estado do Pará e criado o Território Federal do Amapá.
Com a chegada de operários e trabalhadores de várias áreas de atuação, trazidos
pelo então interventor, Janary Gentil Nunes, os trabalhadores de outros
Estados, em especial os do Pará, acostumados à folia, decidiram “botar o
bloco na rua”.
Com o tempo o carnaval foi se organizando, criando os blocos
de sujos, Escolas de Samba, bandas, mascarados, carnaval de salão e toda a
alegria dessa época. Os primeiros Reis Momos, lembrados pela velha
guarda, sem firmeza de datas, começou na década de 60. Os precursores,
imitações dos grandes centros, foram Altair Lemos, boêmio de nascença,
um senhor alto, branco e bem forte, que morava no Laguinho, berço da Universidade
de Samba Boêmios do Laguinho, fundado em 02 de janeiro de 1954. Altair
Lemos faleceu em 1969. Foi então que o Bola 7 assumiu o trono. Era
um negro forte, tratorista da Prefeitura Municipal de Macapá, que fez
por muitos anos a coleta de lixo domiciliar de Macapá. Nada
oficializado. Tudo na base do faz de conta, embora considerados pelos brincantes.
A voz do Povo é a voz de Deus, diz o Velho Deitado.
Quem
foi Altair Lemos?
Altair
Cavalcante Lemos,
nasceu em 11 de janeiro de 1932, em Macapá. Filho de Cícero Lemos e Carmosina
Cavalcante Lemos, primeira mulher a ser tabeliã no Cartório Jucá. ALTAIR
teve dois irmãos, Altamir e Maria da Consolação, já falecidos. Altair Lemos foi
um dos precursores ambientalistas no Amapá. Quando funcionário da Prefeitura de
Macapá, foi um dos criadores da “Turma do Buraco”,. Nada a ver com o carteado.
Reuniu estudantes do Colégio Amapaense e plantaram as primeiras mangueiras no centro
de Macapá. Fizeram a arborização da Praça "Barão do Rio Branco", avenidas Presidente Vargas,
Mendonça Furtado, Iracema Carvão Nunes, entre outras.
Altair
também gostava de jogar baralho com os amigos. Foi da mesa do carteado, jogado
nos finais de semana na sede do Amapá Clube, que junto com Amujacy, Jarbas
Gato, Zé Maria Frota e Aderbal Lacerda, saíram em uma manhã do carnaval de
1965, fantasiados com roupas, perucas e maquiagens das esposas para as ruas do
centro de Macapá.
Com
uma enorme faixa escrito BLOCO DOS INOCENTES, os amigos barbarizaram a
terça-feira gorda e chamaram a atenção por onde passavam. Em 1964, os
mesmos amigos “INOCENTES” criaram o Bloco A BANDA. Por seu porte físico, ALTAIR
foi coroado como o REI MOMO DO CARNAVAL. O 1º na história do carnaval
amapaense, diga-se.
Em
maio de 1954, ALTAIR se casou com Graça Lemos, com quem teve cinco filhos:
Nilton Mauro, Paulo Cezar, Antônio Sérgio, Gláucia Maria e Tica Lemos. Paulo
Cezar, conhecido como Paulão que também brilhou nas quadras como jogador de
basquete, faleceu em junho de 2002.
Em
dezembro de 1969, ALTAIR sofreu um enfarte. Foi levado para Belém, mas, na
tarde do dia 28 de dezembro, não resistiu a uma parada cardíaca e faleceu, aos
37 anos. (blog
porta-retrato)
Imagem: WEB
Não se sabe ao certo quando o Raimundo dos Santos Souza, o
Sacaca, foi coroado.
Foto: blog De Rocha (Reprodução)
Aí começou de direito o reinado Momo, sendo oficializado pelo
prefeito.
Mas o reinado de Sacaca ao lado da Alice Gorda, Rainha Moma, foi
longevo. Ele morreu em 1999, aos 73 anos de idade e somente em 2003, que
Raimundo Tavares, o Sucuriju, assume o trono. Sucuriju nasceu em 23/03/1953 e
faleceu em 03/02/2023, aos 69 anos.”Papai era registrado somente no nome da
minha avó, Francisca Azevedo Tavares”. "Mas era feliz e um filho dedicado",
informa a filha Heliane, mais conhecida tanto em casa como na comunidade por
Preta. “Acho bem carinhoso quando me chamam assim”, confessa. Foi ela quem se
prontificou a nos conceder a entrevista.
Sucuriju era casado com Dani Costa Tavares, com quem teve
cinco filhos: Denilson, Heliane (Preta), Raimundo ( Mikiba), Helena e William Tavares. Conheceu e conviveu com os nove
netos. “A mamãe faleceu em 2013. Depois ele arrumou uma namorada. O nome dela é
Luciene”, relata Preta. Ele era funcionário da prefeitura, desempenhava a
função de motorista. Em outubro de 2020 ele passou na transposição para o
quadro federal.
Preta lembra com saudades e risos do pai:” Meu pai sempre
foi muito amigo de todos. Sempre tivemos hóspedes em nossa casa. Tanto para
morar, passar uma noite, alguns dias ou somente para passar o dia em nossa
casa. Era festeiro. Ele amava ter a casa sempre cheia. Era amigo para as horas
boas e para momentos ruins. E não era por um momento, foi à vida toda”,
recorda Preta. "Nunca tivemos panelas de tamanho normal em nossa casa. Sempre
foram panelões. Porque sempre chegava alguém sem precisar por mais água no
feijão," brinca Preta.
Ele era funcionário da prefeitura, desempenhava a função de
motorista. Em outubro de 2020 ele passou na transposição para o quadro federal.
Preta adianta que nesse período não sentiam a ausência dele durante o exercício
do “reinado”, devido aos inúmeros compromissos. “Nós também íamos juntos,
participar, entrar na onda”, relembra.
"Moramos por muito tempo na casa da minha avó paterna no Jesus
de Nazaré, na Avenida Padre Manoel da Nóbrega. Depois moramos na casa da minha
avó materna no Centro, na avenida Presidente Vargas. Depois moramos na avenida
Marcílio Dias bem de esquina com a rua Odilardo Silva, de onde tivemos que sair
às pressas devido a um aterramento mal planejado e nossa casa começou a tombar.
Ficamos sem casa e voltamos a morar na casa da minha avó paterna e depois
materna, acabamos fazendo o mesmo trajeto anterior. Ninguém sossegava até que
em 1985 nos mudamos para o bairro Jardim Felicidade." Era um bairro novo. Tudo
estava começando. Pouquíssimos moradores. Não tinha nem energia elétrica, água
só do poço amazônico. “Recomeçamos do zero
em uma casa emprestada pelo meu padrinho, Alceu Paulo Ramos”, narra Preta.
"Nós sempre vivemos tudo junto com ele. Participávamos do
máximo possível. Em casa reunia um grupo de casais, juntamente com alguns
amigos. Reuniam-se em casa todos os finais de semana. Nesses encontros o papai
deu a ideia de fundar uma escola de samba e ele falava nesse assunto todas as
vezes que estavam juntos."
Até que todos concordaram e em julho de 1987 foi fundada a
Escola de Samba Mocidade Independente Jardim Felicidade. “Papai foi um sambista
precoce, juntamente com o Neck”. Desde os nove anos já era passista dos Boêmios
do Laguinho. E foi se especializando. Era baterista, mestre de bateria,
passista, mestre sala. Nossa casa era samba o ano inteiro.
Preta fala com orgulho pelo fato de Sucuriju ter sido um
dos fundadores da União dos Negros do Amapá (UNA), em 1988 quando do Centenário
da Abolição da Escravatura. Durante a missa, realizada na Igreja de São
Benedito, “quando o papai fez uma bela performance. Foi lindo. Memorável”,
relembra.
"Na Escola Mocidade Independente Jardim Felicidade, Sucurijú foi
mestre sala, presidente, vice-presidente, ele foi de tudo um pouco. Tipo o
jogador que bate escanteio, corre para cabecear e ainda agarrar a bola.
Versátil, múltiplo e com vigor e alegria," ilustra Preta.
Sucuriju viveu intensamente. Era menino da Sede dos
Escoteiros do Laguinho, jogava bola no Bariri, onde hoje é a União dos Negros
do Amapá – UNA – No Campo do América, atual Praça Chico Noé. Vivia na sede dos
Boêmios. Veio de uma família pobre e foi Rei. Rei da alegria, da união,
solidariedade, da Mocidade, dos Boêmios. Foi o Rei do Carnaval durante 20 anos.
Hoje fazemos essa homenagem póstuma, no reino do carnaval de 2024.
(13/02/2024 - Atualizado às 10h30)