Transcrevemos hoje para os leitores do blog Porta-Retrato – Macapá, matéria do Jornal Diário do Amapá, na Coluna NOTA 10 – publicada em 14/6/2015, que destaca com detalhes a bravura do pioneiro Walter Pereira do Carmo, no Amapá.
Walter
do Carmo: a bravura de um pioneiro
Desbravar.
Essa foi a essência do espírito de Walter do Carmo. Irrequieto, foi além
– abriu praticamente todas as estradas que hoje o Amapá possui. Na área
urbana, construiu escolas e clubes, entre outras obras. E ainda foi um exemplo
de probidade. Eis a marca de um pioneiro.
Nascido
em Prainha, no município de Monte Alegre, no estado do Pará, Walter
Pereira do Carmo conhecia o recém criado território federal do Amapá
por vir com os pais visitar parentes em Mazagão Velho. Aos 17 anos, já
funcionário público com formação técnica em agrimensura, começou, sem saber, a
traçar seu caminho para o Amapá. Dizem que sua vinda definitiva se deu
ao cumprir uma missão da antiga Comissão de Rodagem do Pará, que depois
seria transformada no DEER (Departamento Estadual de Estradas de
Rodagem). A missão era, justamente, entregar o projeto da BR 156. Aí foi
o começo do saudoso Walter do Carmo. Depois de marcante trajetória, ele
morreu no dia 14 de junho de 2014.
Era o
decisivo ano de 1951, e Walter, com 21 anos, foi convidado pelo então
governador Janary Nunes para ficar no Amapá. Aceitou e começou a
trabalhar como encarregado dos Serviços de Melhoramentos, Cortes e Aterros
da Rodovia BR 15, atual BR 156. Construiu o ramal do Aporema
com 14 quilômetros de extensão.
No dia 13 de outubro de 1951 iniciou a implantação pioneira do trecho Base Aérea de Amapá-Calçoene, numa extensão de 76 quilômetros.
Em 1952,
durante o inverno, operou nas medições de volume das águas do rio Araguari,
na Cachoeira do Paredão, onde seria construída a Hidrelétrica Coaracy
Nunes. No dia 17 de setembro, concretizou a ligação do trecho Base Aérea
de Amapá-Calçoene e imediatamente iniciou a construção do trecho Calçoene-Lourenço.
Nesse mesmo ano efetuou os estudos para a ligação rodoviária Ferreira Gomes-Cachoeira
do Paredão e iniciou o desmatamento para a construção do Porto de
Santana.
De 1953 a 1955 concluiu o trecho Calçoene Lourenço, com 116 quilômetros. Construiu os ramais de Cachoeira Grande e Juncal e o campo de pouso de Calçoene.
Na cidade de Amapá conheceu Helita Ferreira dos Santos, filha de
um pecuarista, com quem casou seis meses depois, sendo o governador Janary
Nunes um dos padrinhos. Dessa união nasceram sete filhos, Margareth,
Walter Júnior, Waldenawer (Keky), Mariângela, Wank, Márcia e Walber.
Em 1956
executou para o governo do Amapá várias expedições de pesquisas
minerais, destacando-se a prospecção de xisto betuminoso na região do rio Cajari,
e bauxita e magnetita nas regiões do Jari, Tartarugal Grande,
Tartarugalzinho e rio Cassiporé.
Em 1958 surgiu a oportunidade que mudaria o rumo de sua vida e dos amapaenses.
Pauxy Nunes, irmão de Janary, assumiu o governo e priorizou a continuação da abertura da rodovia em direção ao Oiapoque, que passava em aldeias indígenas.
“Se aqui
chegamos, muito mais longe iremos”
(Walter
do Carmo, ao chegar em Oiapoque)
Em 1965
as máquinas pesadas, nunca antes vistas por aqui, chegaram via marítima, e o
serviço começou. A estrada era aberta até Amapá, e a missão era chegar
até à fronteira. Foram meses embrenhado nas matas com homens e equipamentos,
abrindo o caminho que até então era percorrido por poucos. Entre Macapá
e Amapá, já chefe de família, Walter do Carmo viveu todas as
particularidades de um desbravador, quando o mundo oferecia poucos recursos
para aventura, como a abraçada pelo então empreiteiro.
Nesse
mesmo ano construiu o ramal Cupixi-rio Vila Nova, com 30 quilômetros de
extensão e o campo de pouso da localidade de Gaivota, no rio Vila
Nova. Construiu ainda a rodovia Macapá-Macacoari com 150 quilômetros
de extensão.
“Nunca
fui rico, apenas tinha crédito na praça”
(Walter
do Carmo)
De 1966 a
1970 construiu o Ginásio Paulo Conrado, a Escola José de Alencar,
um pavilhão do IETA, (Instituto de Educação do Amapá), Escola
Princesa Isabel, Biblioteca Pública, hoje Biblioteca Elcy Lacerda,
17 casas para funcionários do governo, dois pavilhões do Grupo Escolar
Alexandre Vaz Tavares, o Fórum da Justiça Federal, inaugurado pelo
presidente Costa e Silva, 21 pontes de madeira sobre pilares de concreto
ao longo da BR 156, no trecho Lourenço-Oiapoque, e melhoramentos
em 200 quilômetros de caminho de serviço da rodovia e centenas de reformas em
prédios públicos.
No dia 24 dezembro de 1970, em um pequeno Jeep, Walter do Carmo, na companhia de Zé Grande e do mestre Ouvídio, escoltados por uma Toyota dirigida por Vicente Cabraia, conseguiram chegar até ao Oiapoque.
E após 16 anos, como foi acertado com Janary Nunes, a BR 156, que
liga Macapá à fronteira, foi entregue ao então governador Ivanhoé
Martins.
De 1971 a
1972 executou serviços de terraplanagem com equipamentos pesados no trecho Calçoene-Lourenço
e consolidou o caminho de serviço no trecho Lourenço-Oiapoque, restaurou
os ramais do Apuema e Tucunaré e fez o revestimento e obras de
artes no trecho Ferreira Gomes-Amapá- Calçoene.
De 1973 a 1975 iniciou e desenvolveu a implantação básica da BR 156 no sentido Norte-Sul, trecho Oiapoque-rio Cassiporé, implantando toda a infraestrutura, incluindo porto para desembarque de equipamentos pesados, fábrica de manilhas de concreto armado; campo de pouso no km 64.
Participou da construção dos
primeiros seis quilômetros da rodovia Perimetral Norte em colaboração
com a Construtora Mendes Júnior e hospedou na Fazenda Nossa Senhora
do Carmo (105) toda a equipe responsável pela implantação da rodovia e a
comitiva do presidente Emílio Garrastazu Medici, incluindo os ministros Mário
Andreazza e Costa Cavalcante.
Em 1975,
o governo do Amapá decidiu modificar o traçado da rodovia, abandonando
250 quilômetros já construídos. O contrato foi com a Construtora Carmo.
Além da BR
156, Walter do Carmo foi o responsável por levar o progresso para outros
cantos do território. Foi ele quem abriu os ramais para que veículos entrassem
mais facilmente nos municípios de Amapá e Calçoene, Base Aérea do
Amapá e para a localidade Lourenço. Construiu ainda campos de pouso
em Tartarugalzinho, Calçoene e Cunani.
Tudo corria bem até que o contrato com o governo foi rescindido na administração de Artur Azevedo Hening, em 1975, ignorando uma das cláusulas que previa o translado do maquinário para a capital. As máquinas utilizadas na construção da BR 156 ficaram abandonadas ao longo do primeiro traçado da estrada e jamais recuperadas. Pela quebra do acordo contratual foi movida uma ação contra o território, que foi vencida pelo empresário muitos anos depois, quando a Construtora Comercial Carmo Ltda. já estava fechada. O dinheiro serviu para pagamento de indenizações trabalhistas e multas do INSS.
Construtor,
pioneiro, desbravador e aviador
Nos anos
70 Walter do Carmo construiu os clubes mais bem frequentados, Círculo
Militar, Macapá e Amapá Clube. Além de desbravador e construtor, Walter
gravou seu nome na história do Amapá como pioneiro, palavra que levava
ao pé da letra. Foi um dos fundadores do Lions Clube, Maçonaria, Igreja
Messiânica e sua paixão: o Aeroclube.
Realizou um sonho de infância em seus anos de ouro, quando se tornou aviador. Ao conhecer o boliviano capitão Belarmino Bravo, juntou seu desejo e espírito empreendedor à paixão do visitante, e juntos formaram a primeira turma de pilotos “brevetados” da cidade, e fundaram o Aeroclube de Macapá, em 1956.
Na turma estava Hamilton Silva, que morreu em 1958, no acidente de avião em que também faleceram o deputado Coaracy Nunes e seu suplente Hildemar Maia. Diziam na época que estava prevista a ida de Walter do Carmo nessa viagem.
“Prefiro
dormir sem ceia do que acordar com dívida” (Walter do Carmo)
Em 1985 o
governador Jorge Nova da Costa, acreditando no potencial de Walter do
Carmo, deixou sob sua responsabilidade o asfaltamento de 50 quilômetros da BR
156. Ele foi buscar no Paraná a empresa CR Almeida para o serviço.
No ano de 2003 o governador Waldez Góes o nomeou assessor especial, como
conselheiro da gestão, cargo com que sobreviveu até 2010. Ao morrer, dia 14 de
junho de 2014, recebia apenas a pensão do INSS.
A ação de
milhões ajuizada pelos associados e familiares do Aeroclube, por ter o
governo do Amapá instalado órgãos públicos, hoje Centro
Administrativo, na avenida FAB, sem desapropriar a área, ainda corre
na Justiça do Amapá. Além dos sete filhos com Helita, entre eles
o Keky, médico recém formado falecido há 28 anos, Walter deixou
mais dois filhos, Walmir e João Vitor.
Texto da
jornalista Marileia Maciel
O pioneiro Walter do Carmo, faleceu
em Macapá, em 14 de junho de 2014, aos 84 anos.
Fonte: Memorial
Amapá
Fotos: Acervo família Carmo
Via Facebook
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