quarta-feira, 15 de junho de 2011

Chaguinha: Um Pioneiro de Macapá

(Reprodução)
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(Foto de Daniel de Andrade Simões -Gaia - Extraída do blog SAITICA)
Por Paulo Tarso Barros (*)
Francisco das Chagas Bezerra, natural do município cearense de Quixadá, nasceu a 15 de dezembro de 1907. Não chegou a conhecer o seu pai, mas foi criado pela mãe, uma artesã que fabricava objetos cerâmicos e sustentava 9 filhos. Chaguinha desde muito cedo começou a trabalhar para ajudar sua mãe. O menino, então com 7 anos, saía de casa para comercializar potes, bilhas, panelas e outros objetos de uso doméstico. Lembrava-se perfeitamente de um movimento político ocorrido no Ceará e denominado “Jagunçada”. Assistiu e sofreu as consequências da grande seca de 1915 e que rendeu o famoso romance de Rachel de Queiroz “O Quinze”.
A grande mudança na sua mentalidade de menino esperto e acostumado desde a mais tenra idade a lidar com as adversidades do sertão nordestino aconteceu quando ele aprendeu a ler e a escrever com a sua madrinha, que o tratava como um membro da própria família e com quem aprendeu as primeira lições de democracia e justiça. Na sua cidade natal verificou as enormes desigualdades sociais, pois havia um coronel dono de muitas e muitas terras enquanto a maioria do povo, inclusive a sua mãe, não possuía nada. Ele então perguntava aos mais velhos o porquê daquela situação e ouvia a singela resposta de Deus dera as terras ao coronel. Mas o menino logo entendeu que aquilo não era produto de uma partilha divina, mas sim humana. Os latifúndios eram fruto da ambição e da injustiça social que sempre prevaleceu no Brasil e que ele iria combater durante toda a vida.
Chaguinha só fez o curso primário, mas seu aprendizado na vida dura que sempre levou o ensinou bastante a adquirir uma brilhante consciência política e a acreditar firmemente no socialismo. Aos 16 anos mudou-se para Fortaleza e começou a trabalhar como ajudante de conferente numa ferrovia federal, emprego que conservou durante dois anos. Logo depois passou por vários pequenos empregos na capital cearense, onde morava em pensões. Considerava essa fase a mais profícua da sua vida como aprendiz das grandes ideias políticas e sociais, pois conseguiu montar uma banca de jornais (naquela época um quiosque) e conviveu com jornalistas, intelectuais e políticos cearenses. Lia todos os jornais e conseguia, ao mesmo tempo, compreender cada vez mais a realidade que o cercava.
No ano de 1933, quando ainda morava numa humilde pensão da capital cearense, encontrou um paraense de Castanhal que fora em busca de tratamento médico. Os dois tornaram-se amigos e um dia Chaguinha chegou ao quarto do enfermo e o encontrou chorando e profundamente deprimido. O motivo, disse-lhe este, era o temor de morrer longe da família. Chaguinha comoveu-se com o sofrimento daquele senhor e disse-lhe que o levaria de volta para casa. E cumpriu a promessa. Antes do final daquele ano de 1933 desembarcou em Castanhal, onde ficou morando com a família do seu amigo numa colônia agrícola. Este lhe pediu que alfabetizasse os seus filhos e demais familiares e Chaguinha assim o fez. Nessa colônia, onde permaneceu até 1946, além do trabalho de professor, ele também fabricava farinha de mandioca. Em 1947 foi para uma outra colônia agrícola e em 1949, adoecendo, Chaguinha viajou para Belém em busca de tratamento médico. Na capital paraense, logo tomou contato com os militantes do PC do B e candidatou - se a uma vaga de deputado estadual.
Depois dessa experiência, mudou-se para o Amapá, estabelecendo-se na Colônia Agrícola do Matapí. Mas foi no ano de 1951 que Chaguinha finalmente resolveu morar em Macapá, escolhendo a árdua profissão de carregador autônomo, sem vínculo empregatício com o governo do Território, pois na sua concepção ele julgava importante manter-se livre de quaisquer empecilhos que inviabilizassem ou atrapalhassem as sua ideias socialistas.
Sendo o Território Federal do Amapá governado por militares, as ideias socialistas de Chaguinha não eram bem aceitas. Mas ele, juntamente com o padeiro Jorge Fernando Ribeiro (já falecido) e outros companheiros, sempre lutaram por uma sociedade mais justa e fraterna. Por isso mesmo Chaguinha, que era um trabalhador honesto e que, como pioneiro, muito contribuiu nos primeiros anos de existência do Território, foi preso diversas vezes. Em 1964, época de arbítrio, foi preso acusado de ser Comunista. Em 1973, no famoso caso do “Engasga-engasga”, foi novamente preso junto com o poeta e advogado Isnard Lima, Odilardo, o padeiro Jorge Fernando e seus familiares. Chaguinha foi amarrado com arame e transportado para Belém, onde permaneceu por 20 dias.
Sempre vivendo humildemente, lendo e interpretando a história, Chaguinha jamais renunciou às suas ideias de justiça social, pois desde menino conviveu com os problemas mais graves que desafiam a inteligência e a boa vontade dos políticos e da elite que governa o Brasil: a distribuição de terra.
No final de 1996, o Governo do Amapá fez uma importante homenagem a esse brasileiro cearense criando o Centro de Juventude Chaguinha.
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(*) Escritor, presidente da Associação Amapaense de Escritores - APES
Copyright © by 1997 Paulo Tarso Barros

Nota do Editor: Texto atualizado, extraído do original - Paulo Tarso Barros / Chaguinha / Biografia - especialmente adaptado para o blog Porta-Retrato.
(Repaginado em 2011)

2 comentários:

  1. Chaguinha, comunista autêntico, era fiel escudeiro do sr. Amim Richene, pai do Nabil, que tinha um comércio na esquina da mendonça furtado com leopoldo machado, era concorrente da casa duas estrelas, do Sr. Manoel Pinheiro. Com a passagem do sr. Amim para outro plano, chaguinha mudou-se para um quartinho alugado na casa da dona Júlia, mão do Breca, casado com a Orlandina, irmão do Laurindo Banha e do Izídio. Chaguinha foi pioneiro na função de realizar carreto na doca da fortaleza, com um carrinho de mãe cheio de estilo, tinha chapa e uma gaveta onde ele guardava, para não molhar, tabaco e seu inseparável cachimbo. Pena que ninguém teve a idéia de guarda o carrinho de mãe em um museu. Sapiranga

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  2. Excelente observação Sapiranga.
    Eu me lembro do Chaguinha quando ele prestava serviço para o Loide Aéreo Nacional, em seu carrinho de mão com as características que você descreveu.
    O carro deveria ter sido colocado em um museu, sim.
    Afinal, ele foi um dos pioneiros de Macapá.
    grande abraço

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