Segundo o historiador
Nilson Montoril de Araújo, embora a
igreja de São José, seja o mais antigo monumento patrimonial da sua história,
não foi a primeira a ser erguida na “Província dos Tucujú”.
O
primeiro templo era bem humilde, tendo um altar de madeira, sobre o qual ficava
a imagem de São José, pai putativo de Jesus
Cristo.
Deve
ter sido construída ainda no final do ano de 1751, na área onde está erguida a
Fortaleza. Pouco tempo depois, ainda no mesmo local, foi erigido um novo templo,
em taipa, e coberto de palha.
A Paróquia de São José de Macapá foi criada em 1752, sendo
nomeado como Vigário o Pe. Miguel Ângelo de Moraes, presente no povoado desde
novembro de 1751. No dia 4 de fevereiro de 1758, ocasião em que o povoado de
Macapá foi elevado à categoria de vila, se deu o lançamento da pedra
fundamental de uma nova igreja, no Largo de São Sebastião.
A 6 de março de 1761, o templo foi inaugurado.
As plantas
foram elaboradas pelo Sargento Mor da vila e aprovadas pelo arquiteto italiano
Antônio Landi, especialista em cartografia e construções.
O aspecto do templo era bem singular (foto acima).
Nas laterais havia uma
porta e uma janela alta. A frente do prédio tinha uma porta central de uma só
folha. Ao alto, figuravam duas janelas gradeadas com ferro. Ao lado esquerdo do
templo se levanta um campanário com uns 15 metros de altura. Em cada face do
campanário há um sino.
O acesso ao campanário era feito por uma porta posterior
à fachada, cujo acesso era feito através da “Passagem Espírito Santo”, existente
à esquerda do templo, entre o ele e a Casa Paroquial.
A escada que leva ao piso onde são puxadas as cordas dos sinos é de madeira.
À direita da Igreja de São José havia a “Passagem Santo
Antônio”, separando a casa de orações do prédio do Senado da Câmara.
Conforme a planta da
Vila de São José de Macapá, traçada em 1761, pelo Capitão Engenheiro
João Geraldo Gronsfeld, a igreja tem a frente para a Rua São José. O fundo
demanda para o “Largo dos Inocentes”, cortado por uma estreita via denominada
“Rua dos Inocentes”. Os moradores do Largo dos Inocentes usavam as passagens
Espírito Santo e Santo Antônio para terem acesso ao Largo de São Sebastião,
posteriormente Largo da Matriz, e a outros logradouros do burgo.
Até o início
da década de 1980, carros e outras viaturas trafegavam pelas duas passagens.
|
(Foto: Reprodução/Google Earth) |
Para evitar danos à igreja, o poder público autorizou a então Prelazia de
Macapá a fechar, com grades de ferro, a "Passagem Espírito Santo" , permitindo que
os padres se movimentassem com tranquilidade entre a Sacristia e o imóvel onde
residiam.
Por ocasião da ampla reforma pela qual passou a Biblioteca Elcy
Rodrigues Lacerda, erguida na área do velho Senado da Câmara, a largura da
Passagem Santo Antônio foi drasticamente reduzida.
As alterações feitas no contorno da igreja foram amplamente
aprovadas pela população, haja vista que o barulho produzido por veículos
automotores e indivíduos contrários ao catolicismo perturbavam as orações, as
missas, as novenas, as celebrações de casamentos e a ministração do batismo e
crisma.
A coberta da igreja sempre foi de telha de barro, com um considerável
beiral que protegia as paredes. Há informes de que suas características do
estilo arquitetônico inaciano foram sendo modificadas com as reformas
introduzidas.
A reforma mais expressiva, feita antes da chegada dos padres
italianos, é mérito do sacerdote francês François Rellier, no início do século
dezenove.
O registro descritivo mais rico em detalhes é obra do Padre Júlio
Maria Lombaerd, que desembarcou em Macapá a 27 de fevereiro de 1913, egresso de
Belém. Além de descrever aspectos da cidade, Padre Júlio fala da igreja: “Da
cidade baixa, fomos para a cidade alta, construída na planície. Primeiramente
chegamos a uma grande praça, de mais de dois hectares de superfície. É a Praça
da Matriz. E, realmente, na nossa frente, do lado oposto da praça, ergue-se
solene, quase majestosa, uma grande igreja de pedra. Destaca-se no meio de tudo
que a cerca. De construção regular, coberta de telhas francesas, com uma torre
ao lado, como todas as igrejas brasileiras, tem um tríplice pórtico, encimado
de três belas janelas com vidro. Uma escultura simples, mas de bom gosto.
Termina com o pinhão que serve de base para uma cruz branca, dando ao conjunto
um toque de esperança e de futuro. Um pavimento ladrilhado, à maneira europeia,
forma diante do pórtico, uma bela plataforma que termina de cada lado, com uma
coluna de madeira com lâmpadas para iluminação”.
Observa-se que, nos termos da narrativa do Padre Júlio Maria
Lombaerd, na fachada da igreja já existiam três portas, três janelas com vidros
e pinhões no frontispício. São detalhes arquitetônicos que passaram a figurar
após as reformas feitas por iniciativa do Padre Rellier. A iluminação das ruas
e travessas de Macapá era a querosene, havendo um servidor municipal que
acendia e apagava as luminárias. Voltemos às narrações do Padre Júlio Maria
Lombaerd: “Entrando no Santuário, onde não pude conter uma exclamação – Que
igreja bonita! E de fato, é uma das mais belas que encontrei, até agora, nesta terra
brasileira. É simples e muito e muito simples mesmo e, por conseguinte, sem
pormenores arquitetônicos; mas esta simplicidade lhe comunica algo de
majestoso, quase misterioso. Tendo apenas uma nave central, sem as laterais,
permite-nos vê-la, no conjunto, com o primeiro relance de olhos e avaliar suas
dimensões. A nave, da porta de entrada até a mesa de comunhão, mede 22 metros
de comprimento por 11 de largura. A estrutura é regular e sem saliências. As
paredes são brancas; o piso é de ladrilhos de cimento, com desenhos variados e
três divisões com imitação mosaica, marcando a linha média da nave. O altar-mor
está bem acima do piso, com seis grandes degraus. De cada lado do altar estão
dois outros altares, do mesmo modelo, porém menores. Um tem, na última
banqueta, a imagem do Sagrado Coração de Jesus; o outro a de Santo Antônio,
mas, na banqueta principal está a imagem de São José, o padroeiro da igreja. O
coro é separado do corpo da igreja por uma magnífica mesa de comunhão de ferro
fundido. Nesta parte, o corpo da igreja se estreita de maneira a deixar
bastante espaço, a cada lado da mesa de comunhão, para dois altares; um
consagrado a São Benedito, e outro, a Nossa Senhora, ou antes, a um grupo de
Santas Virgens. Há umas três ou quatro imagens destas Virgens, todas bem
estragadas; umas mais do que as outras – carcomidas, quebradas. A uma falta
mão; a outra braços. São todas pintadas de cores berrantes, quase ridículas.
Do lado do Evangelho está um lindo púlpito esculpido em
cedro. No meio da igreja há dois altares laterais, um em frente ao outro. Um
consagrado não sei a qual santo, porque há as imagens de São Miguel, São
Vicente de Paulo, São Raimundo Nonato, São José e São Tomé, etc. Uma coleção de
antiguidades. O do outro lado é consagrado à Sagrada Família. Ao entrar na
igreja, o fiel podia ver dois altares separados por uma linda grade de ferro
fundido. Um é o altar – túmulo (à direita), com a imagem do Salvador no
sepulcro. É encimado pela imagem de Jesus carregando a cruz. Do outro lado está
o batistério”.
A partir do segundo semestre de 1948, outras modificações
aconteceriam. Presentes nas terras do Amapá desde 1911, os Padres da
Congregação da Sagrada Família a deixaram em junho de 1948, repassando ao
Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras a missão evangelizadora que
haviam recebido em 1911. Os sacramentinos foram substituídos pelos sacerdotes
italianos. Os dois primeiros, Aristides Piróvano e Arcângelo Cerqua, chegaram
dia 29/5/1948. No dia 25 de junho de 1948, chegavam a Macapá, por via fluvial,
os padres Luiz Viganó, Mário Limonta, Lino Simonelli, Carlos Bassanini e
Vitório Galliani. Mestre em restaurações, o Padre Mário Limonta ficou
encarregado de reformar a igreja e a casa paroquial.
No fundo do templo,
foi modificado o altar central, permanecendo nele a imagem de São José.
Nos
altares ao lado, as imagens do Sagrado Coração de Jesus e a de Santo Antônio de
Lisboa cederam espaço para dois belos painéis pintado pelo Pe. Lino Simonelli.
|
(Foto de Paulo Tarso) |
À
esquerda, cena da Sagrada Família fugindo para o Egito.
|
(Foto de Paulo Tarso Barros) |
À direita, a Sagrada
Família foi retratada trabalhando na oficina de carpintaria de São José.
A
Imagem do Sagrado Coração passou a ocupar o altar onde ficava a imagem de São
Benedito, à esquerda da mesa de Comunhão.
À direita, saíram as
Santas Virgens, colocando-se na banqueta a Imagem de Nossa Senhora do Rosário.
Os altares laterais da nave principal foram eliminados. O púlpito permaneceu
recebendo melhoramentos. A mesa de comunhão de ferro fundido foi retirada e
substituída por outra de alvenaria. A igreja foi pintada por dentro e por fora.
Nas laterais foram abertas três portas de cada lado e
fechadas as janelas. Posteriormente, em decorrência das decisões do Concílio
Vaticano II, a mesa de comunhão deixou de existir, retirou-se o púlpito, o
batistério e os bancos próximos ao altar principal. Os padres passaram a
celebrar a missa em português e de frente para os fiéis. Com o advento da nova
catedral, surgiu a ideia de transformar a velha igreja no Santuário de São
José, com a reinstalação dos pormenores de outras épocas.
|
(Fotos de Paulo Tarso Barros) |
Observa-se no interior da igreja que há várias pedras
tumulares indicando o local onde teriam sido sepultadas pessoas gradas da
comunidade macapaense(fotos acima). Essas lápides estão assentadas no piso e nas paredes,
mas acredita-se que nenhum sepultamento foi realizado no interior do templo. A
colocação de uma lápide dependia da atuação do morto no dia a dia da religião
que professava, do status que o falecido e sua família ostentavam na cidade. O
poder aquisitivo dos familiares também era vital para a obtenção da licença
para a colocação das chamadas “lápides de penitência” ou “lápides de
lembrança”. Os corpos das pessoas mencionadas nas lápides da igreja teriam sido
sepultados no Cemitério Nossa Senhora da Conceição.
Texto do historiador Nilson Montoril, publicado originalmente no blog do autor: Arambaé.
Fonte consultada: A Fortaleza de Macapá como monumento e a cidade
como documento histórico (Dissertação apresentada ao curso de
Mestrado Profissional do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional por Jaqueline Ferreira de Lima Brito, como pré-requisito para obtenção do título de
Mestre em Preservação do Patrimônio
Cultural.)
Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Jaqueline%20Brito.pdf, consultado em 5 de fevereiro de 2017.