Com a devida vênia de seu autor, tomo a liberdade de compartilhar com os leitores do blog Porta-Retrato, um texto de Nilson Montoril, narrando um fato acontecido na Macapá de outrora.
UM INTRIGANTE ACIDENTE AÉREONilson Montoril
Numa
manhã do mês de julho de 1957, estando de férias escolares, fui encarregado de
comprar pães na Fábrica Amapaense, cujo prédio estava erguido onde hoje
funcionam a Loja Domestilar de frente para a Rua Tiradentes. Ao lado, anos
depois, surgiu o segundo prédio da Caixa Econômica Federal. A cidade de Macapá,
ainda pequena, praticamente dormia. Ao me aproximar da Av. Coriolano Jucá vi
que muita gente corria em direção da Av. Iracema Carvão Nunes, no sentido do
aeroporto. Abelhudo como todo moleque, comprei 2 pães comuns e fui bisbilhotar
o que havia acontecido. Ao chegar em frente ao escritório da ICOMI, observei a
presença de um avião do Lóide Aéreo parado no meio do terreno onde estavam
sendo cavadas as valas para o alicerce da Galeria Comercial. O aparelho parou
no ponto que, depois, abrigou a primeira sede própria da Caixa Econômica. Era
um reboliço danado. Na porta da aeronave apareceu um homem grandalhão, que só
pronunciava pornografia bem cabeludas, de fdp pra cima, e acusava o piloto de
ter arrebentado com o seu "culhão". Imediatamente o reconheci, haja
vista que ele era muito conhecido. Tratava-se do Senhor Tibúrcio, comerciante e
pecuarista, que tinha feito uma cirurgia de hidrocele, em Belém. De dentro do
avião vinha um canto religioso. Eram vozes das moças da irmandade Filhas de
Maria, capitaneadas por freiras de Congregação Nossa Senhora Menina, que tinham
ido a Belém, participar de um evento importante. Como os aviões DC-3 eram altos
na frente, a subida e descida dos passageiros ocorria com um uso de uma escada apropriada,
coisa que não havia por perto. Arranjaram uma estreita escada de madeira em
precárias condições. O artefato quase não alcançava a porta do avião. O
primeiro candidato à descida foi Seu Tibúrcio. No que ele botou o pé no degrau
a peça estalou. O homem recuou e bradou um paneiro de nomes feios. Voluntários
e amigos convenceram Seu Tibúrcio a aguardar a chegada de outra escada. Somente
assim foi possível os demais passageiros desembarcarem. O acidente ocorreu
porque havia chovido bastante de madrugada e a pista de pouso da antiga Panair do
Brasil, que era revestida de capim estava muito lisa. Além disso, o piloto
falhou no momento da aterrisagem e tocou o solo no trecho da pista paralela à
frente ao Hospital Geral. Consequentemente, sobrou pouco espaço para o avião se
deslocar. Assim, a aeronave rompeu a cerca de arame farpado da Rua General
Rondon e avançou para a área que atualmente abriga o Tribunal de Justiça. O
piloto manobrou o avião para o leito da Av. FAB, na época precaríssimo, e
ganhou o rumo da Av. Iracema Carvão Nunes. Parou pertinho dela, porque as rodas
atolaram nas escavações das obras da Galeria Comercial. A grande surpresa que
eu tive foi ver minha irmã, Neyde Montoril, uma das moças cantoras, descendo a
tosca escada de madeira.
Via
Paneiro de Lembranças – Facebook
Fotos: Arquivo do blog e Pinterest
Nota do
Editor:
Na época em
que aconteceu esse acidente eu tinha 9 anos e morava na Av. Presidente Vargas
nº 52 – próximo à Escola Normal (depois IETA).
Lembro bem
da aeronave – modelo Curtiss C-46 Commando que tinha as cores da
empresa - semelhante ao modelo que ilustra esse post. Apenas aeronaves desse modelo usado pelo Lóide Aéreo, voavam para Macapá. Os modelos Douglas DC-3 eram da Cruzeiro do Sul e do Correio
Aéreo Nacional.
(João Lázaro
– editor)