quarta-feira, 4 de julho de 2018

Fotos Memória de Macapá: Os Pioneiros da arte da costura no Amapá

A “Alfaiataria São José”, instalada em Macapá pelo senhor Pedro Ribeiro à Rua 24 de Outubro, na frente de Macapá, foi um marco importante na história da cidade.
Pedro Ribeiro era contramestre da “Alfaiataria Pinto”, em Belém e tinha decidido tentar a sorte no comércio de borracha. Com a produção da borracha em baixa, ele preferiu retomar sua antiga profissão. Casou com Carmosina Reis Cavalcante, filha do Oficial do Registro Civil da Comarca de Macapá, Cesário dos Reis Cavalcante e da senhora Odete Reis. Carmosina estava viúva do senhor Cícero Lemos e tinha os filhos Altair Cavalcante de Lemos, Altamiro Cavalcante de Lemos e Maria das Graças Cavalcante de Lemos. Dos três, apenas o Altamiro aprendeu a costurar.
Esta fotografia é uma das mais antigas da Macapá paraense, batida por volta de 1901. 
Em meados da década de 1920, o prédio que aparece em primeiro plano, feito em taipa de mão, 
abrigou o Cartório de Registro Civil da Comarca de Macapá e a residência do 
Tabelião Cesário dos Reis Cavalcante. 
Na década de 1930, a Alfaiataria São José foi instalada em uma das suas dependências. 
Com a anuência do senhor Cesário Reis, a alfaiataria ocupou um dos cômodos de sua residência. Trabalhavam na alfaiataria o senhor Pedro Ribeiro, sua esposa Carmosina e o garoto Vadoca.  
Vadoca, cujo nome de batismo é Vicente Valdomiro Ribeiro, na época, com apenas oito anos de idade, esbanjava curiosidade e vontade de aprender a profissão que ainda preserva. Nascido e criado na Rua 24 de Outubro, que o povo preferia rotular como Rua da Praia, Vadoca estava sempre perto de sua genitora para ajudá-la nas tarefas de carregar água, rachar lenha, fazer recados e compras. Dificilmente ultrapassava a área da então Praça Capitão Augusto Assis de Vasconcelos (Veiga Cabral) devido à rivalidade que os moleques da Matriz e do Formigueiro devotavam aos pirralhos que residiam na frente da cidade. Só ia à Igreja São José acompanhado dos pais ou de parentes. Vadoca veio ao mundo no dia 7 de setembro de 1932, na casa dos pais, Celso de Atayde Ribeiro e Esmerlinda de Carvalho Ribeiro. Sua genitora era natural do Maruanum e residia na casa da Professora Cora Rolla de Carvalho, sua parenta, quando conheceu Celso Ribeiro. Antes de ingressar na “Alfaiataria São José”, o menino Vadoca realizava deveres domésticos e vendia pasteis feitos pela irmã Angelina e jogava futebol com bola de meia e de sernambi. Angelina era casada com Miguel Gantus e morava no início da Rua do Abieiro.
Só quando estava mais “taludinho” é que passou a jogar com bola de verdade no campo do Cumau Esporte Clube, o time alviverde da Cidade, cujo campo correspondia a uma área entre as Travessas Floriano Peixoto (Presidente Vargas) e Braz de Aguiar (Coriolano Jucá), onde depois foram edificados os prédios dos Correios e da antiga Lojas Pernambucanas. Posteriormente defendeu as cores do Inca, São José, Macapá e Trem. Em 1955, com 23 anos de idade, Vadoca casou com Odineia dos Santos Ribeiro. Continuou jogando futebol por mais quatro anos, deixando de fazê-lo em 1959, porque precisava trabalhar em tempo integral para sustentar condignamente a família. O casal gerou nove filhos, seis mulheres e três homens.       
Antes de 1943, ano em que foi criado o Território Federal do Amapá, a cidade de Macapá tinha alfaiates e costureiras de primeira linha. A alfaiataria do senhor Ataíde ficava na Travessa Castelo Branco (Rua Tiradentes) no espaço onde depois funcionou   o Cartório Jucá.
Seu Ataide José de Lima(Barbudo), era acreano onde nasceu em 08 de abril de 1920; chegou a Macapá em 1943. Residiu inicialmente, na Presidente Vargas em frente à casa onde morava a família Zagury, depois em uma travessa que ficava entre São José e Cândido Mendes, ao lado onde residia o Sr. José Trajano Neto, depois mudou-se para a rua São José esquina com a Cora de Carvalho, onde hoje funciona uma agência do  Banco do Brasil.  Alguns anos depois passou a morar atrás do Hospital São Camilo. Depois que se submeteu à uma cirurgia em Belém em 1962, ele abriu um bar, pois ficou impossibilitado de trabalhar na profissão de alfaiate. Seu Ataíde também era espírita e, nos anos 80 e 90, sempre atendia às pessoas num barracão localizado à Rua Mendonça Furtado, entre as ruas Hamilton Silva e Manoel Eudóxio  Pereira. Depois por motivos de saúde, passou atender só na residência dele.
Seu Ataíde era casado com a paraibana Benedita Alves de Almeida,  com quem teve 7 filhos.
Ataíde José de Lima (Barbudo), faleceu em Macapá no dia 08 de março de 1999 e seu corpo está sepultado no Cemitério de São José, no bairro Santa Rita.
Na Avenida General Gurjão (bairro Alto) atuava o Nelson e no Largo do Formigueiro (atrás da igreja Matriz)  o Lameira. 
Lembro também do Seu Luiz (foto), alfaiate que por muitos anos morou, com a família, na Av. Feliciano Coelho, onde antes funcionou o banheiro público do bairro do Trem e depois foi transformado em  rinhadeiro, palco de concorridas brigas de galo, que reuniam muitos aficionados desse esporte, (uma tradição antiga, que tinha juiz e apostadores), que desde 1998, está proibido no Brasil, sendo considerado crime ambiental. A família do Seu Luiz, continua morando no local, no mesmo prédio agora cedido pela Prefeitura Municipal de Macapá.
Depois da instalação do Governo do Território do Amapá, a 25 de janeiro de 1944, a migração de jovens para Macapá foi marcante. O governo precisava de mão-de-obra para a construção de prédios públicos e para diversas atividades que estavam sendo implementadas. Entre os que buscavam emprego estava Herundino do Espírito Santo, conceituado alfaiate e bom futebolista. Ela conhecia o Pedro Ribeiro e não perdeu tempo em procurá-lo.
Herundino nasceu em Belém dia 23 de julho de 1919, filho de Serafim Ferreira do Espírito Santo e Raimunda Jacinta do Espírito Santo. Fez o curso Complementar no Colégio Dr. Freitas e começou a trabalhar em oficina de alfaiataria onde aprendeu a profissão. Chegou em Macapá em 2 de novembro de 1945, ingressando na antiga Guarda Territorial quando assumiu a alfaiataria da instituição, aprontando o fardamento dos policiais e, nas horas vagas costurava para pessoas da sociedade, inclusive para o Capitão Janary Gentil Nunes, primeiro Governador do TFA. Foi atleta do Esporte Clube Macapá e atleta fundador do Trem Desportivo Clube. Casou-se com D. Joana Silva do Espírito Santo e com ela teve oito filhos. Aceito na “Alfaiataria São José”, Herundino colocou em prática sua larga experiência no corte e confecção de roupas masculinas em casimira. A alfaiataria de Pedro Ribeiro também contou com os préstimos de Hermínio Costa, Antônio, Zé Arigó, Maria e Antônia. Com essa equipe, Pedro Ribeiro atendeu a todas as encomendas que a Indústria e Comércio de Minérios S.A lhe fez. A encomenda da ICOMI compreendia o vestuário que os empregados da empresa usavam. O Antônio também se desligou da equipe de Pedro Ribeiro e seguiu o mesmo caminho traçado por Herundino. O Hermínio Costa, irmão do Hélio Costa, o grande centro-avante do Paysandú, passou a trabalhar na Escola Industrial de Macapá, onde, desde março de 1953, atuava o famoso irmão futebolista. O Formiga e o Passarinho I também fizeram parte da alfaiataria da Guarda Territorial. Todos eles, no período de folga, continuaram realizando atividades particulares em alfaiatarias de amigos. O Herundino montou a “Zaz Traz”, uma alfaiataria estabelecida no Largo da Matriz.
Segundo o Vadoca, a equipe de Pedro Ribeiro era muito boa e o trabalho realizado para a ICOMI agradou plenamente. Nessa fase o Vadoca costurava numa máquina Pfaff de fabricação alemã e aprontava quatro calças por dia. À época, as grandes lojas das capitais brasileiras e cidades mais desenvolvidas não vendiam confecções, só tecidos e armarinhos e isso favorecia os alfaiates. Em Macapá a situação não era diferente. O sujeito comprava a fazenda e a levava ao alfaiate para que ele tirasse suas medidas e fizesse a roupa que desejava. A maioria das lojas comerciais de Macapá vendia secos e molhados. Vadoca trabalhou na “Alfaiataria São José” até 1956, ano em que faleceu Pedro Ribeiro. A alfaiataria já não funcionava na Rua da Praia, mas na Avenida Presidente Vargas ao lado da casa da Dona Carmem (Carmita) Mendes, filha do Coronel da Guarda Nacional Manuel Theodoro Mendes, que comandou a guarnição da Fortaleza de Macapá e foi Intendente Municipal. Vadoca conta que o Pedro Ribeiro tinha um calo no dedo mínimo do pé direito, que o incomodava bastante. Ele costumava cortar a parte dura do calo com uma velha lâmina de barbear, fato que redundou em ferimento que infeccionou. Sem dar a devida atenção ao problema de saúde que a lesão lhe causava, Pedro Ribeiro foi acometido de tétano.
Em 1956, o Governador do Amapá era o médico Amílcar da Silva Pereira, freguês do alfaiate. Ao constatar que o estado de saúde de Pedro Ribeiro era grave, o Dr. Amílcar Pereira o mandou para o Hospital dos Servidores Públicos, no Rio de Janeiro. O estágio do tétano estava tão avançado que a perna do alfaiate precisou ser cortada quase no tronco da coxa. De volta a Macapá, usando uma prótese, Pedro Ribeiro apenas cortava pano, mas não tinha como fazer roupa. Faleceu pouco tempo depois da cirurgia, ainda em 1956. Vadoca ficou gerenciando a alfaiataria por alguns dias, entregando-a a senhora Odineia Ribeiro, com quem Pedro Ribeiro havia casado depois de ficar viúvo de Carmosina Cavalcante. Casado há um ano, Vadoca sentiu que era o momento de trabalhar por conta própria e assim procedeu. Seu primeiro auxiliar foi o Chunda, bom costureiro, mas problemático por causa da bebida. Certa vez, com a cuca cheia de cachaça, o Chunda esqueceu o ferro elétrico ligado sobre a mesa de passar roupa e faltou pouco para a alfaiataria do Vadoca virar cinza. O Chunda também trabalhou com o senhor Ataíde e anos mais tarde foi residir em Laranjal do Jarí, onde pereceu afogado. Vadoca domina como poucos a arte da costura. Faz paletó, blazer, jaquetão, camisa, bermuda, calça  e outros tipos de roupa. Trabalhou muito tempo com o linho caruá, linho tubarão (difícil de cortar), casimira aurora (que não pode ser lavada), tropical (caro e bonito), tricolina (apropriada para camisa), chita (usada prioritariamente para camisão de dormir), seda (tecido preferido pelos festeiros e malandros para camisa de manga comprida porque a navalha não lhe causa danos), brim, tergal (que não perde o vinco), etc. Aliás, o Vadoca trabalha com qualquer tipo de fazenda. Nas décadas de 1940, 1950 e 1960, as fazendas de linho dominavam a preferência dos homens. Por ocasião da festa de São José o macapaense da gema não deixava de mandar fazer calça e camisa para ir à missa, acompanhar a procissão e frequentar o arraial. As autoridades territoriais só usavam ternos de linho muito bem engomados por ocasião das solenidades mais expressivas da cidade. Nas lojas que vendiam fazendas em Macapá, todos os apetrechos necessários à costura eram encontrados. O fecho, que hoje é chamado de zíper só era empregado nas roupas das mulheres. Braguilha da calça de homem só levava botões, todos brancos.
Vadoca nunca quis ser funcionário público, preferindo viver da sua profissão. Começou a pagar a previdência em 1952, como autônomo e sempre primou pelo pagamento das contribuições em dia. Beirando os 86 anos de idade, Vadoca faz expediente em dois turnos, de segunda-feira a sábado na sua frequentadissima alfaiataria, na esquina da Rua Jovino Albuquerque Dinoá com a Avenida Antônio Albuquerque Coelho de Carvalho, bairro central. É um ponto de encontro de novos e velhos fregueses. Ali, Vadoca conta e ouve histórias interessantes sobre todos os assuntos. Em uma das paredes há dezenas de fotografias que comprovam sua condição de jogador de futebol e junto a amigos. Chama a atenção de todos, um espelho cuja moldura faz lembrar o famoso espelho mágico que a madrasta da Branca de Neve usava para saber qual era a mulher mais bela da terra. O espelho que o Vadoca conserva na alfaiataria pertenceu à sua genitora e tem mais de oitenta anos de uso. O alfaiate mais antigo de Macapá ainda confecciona e reforma roupas de acordo com o gosto do freguês. A primeira máquina Singer que ele comprou foi usada de 1956 a 1996. Ainda funcionando bem, foi doada a um amigo. A máquina atual, também da marca Singer, foi adquirida em 1996. Há uma máquina Singer elétrica que ele só utiliza para fazer o arremate de algumas partes da roupa que fabrica. Por recomendação médica, Vadoca deve continuar pedalando sua máquina de costura enquanto o vigor físico das pernas permitir.
(Foto: Reprodução / TV Amapá - print de tela)
Um outro profissional de Macapá, ainda em atividade, é Teodolono Sandim da Silva, de 63 anos, que começou em 1968 como alfaiate da Guarda Territorial do Amapá, e guarda até hoje, os antigos instrumentos de trabalho. (Fonte: TV Amapá)
Texto de Nilson Montoril, atualizado e adaptado ao blog Porta-Retrato, com a devida anuência do autor.
( Fonte: Blog Arambaé - Nilson Montoril
Nota do Editor: Santino Inajosa, também alfaiate da Guarda Territorial, é outro personagem da arte da costura, que não pode ficar fora desse registro. O jornalista Ernani Marinho lembra que a alfaiataria de Santino ficava próximo à Casa Leão do Norte, na antiga Av Amazonas, e depois na Candido Mendes, ao lado da Imprensa Oficial, hoje SuperFácil. A amiga Sarah Zagury, confirma que Seu Santino e Dona Carmosina, esposa dele,  eram amigos de Dona Clemência e Isaac Zagury, pais dela. Grato pela contribuição! João Lázaro.
(Última atualização em 05/jul/2018, às 11h45m)

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