domingo, 22 de setembro de 2024

MEMÓRIA DA JUSTIÇA DO AMAPÁ > PAI DE CORA CORALINA FOI JUIZ DE DIREITO EM MACAPÁ

 Resgate Histórico

Sobrenomes semelhantes aos de uma poetisa goiana de renome nacional, Cora Coralina, identificada como Anna Lins dos Guimarães Peixoto, despertaram a atenção dos pesquisadores Michel Duarte Ferraz (museólogo) e Marcelo Jaques de Oliveira (historiador), do Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP), que atualmente realizam a análise documental de processos judiciais antigos com objetivo de resgatar registros de valor histórico para justiça amapaense, desde o período do Brasil Império (de 1822 a 1889).

Os investigadores criaram uma tabela que continha, ano após ano, os nomes dos magistrados, servidores e outros colaboradores da justiça que foram identificados durante suas leituras. A pesquisa virtual realizada na seção de hemeroteca da Biblioteca Nacional revelou o nome do dr. Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto, que desempenhou o cargo de juiz de direito da Comarca de Macapá em 1868. Ao examinar a biografia de Cora Coralina, verificou-se que ela era descendente do magistrado.

 Fonte: Almanach Administrativo, Mercantil, Industrial e Noticioso da Provincia do Pará para o anno de 1869, p. 389-391.

Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto nasceu em Areias, Paraíba, no ano de 1821. Dada a proximidade com sua terra natal, tudo indica que se formou em Direito pela antiga Faculdade de Direito de Olinda, localizada no mosteiro de São Bento. Sua trajetória profissional inclui a atuação como Chefe de Polícia nas províncias do Amazonas e Piauí. Exerceu a magistratura nas comarcas que fazem parte do Tribunal de Relações do Pará, como Macapá, Manaus e o Termo Judiciário de Cametá. Exerceu a função de Auditor de Guerra da Província do Amazonas. Em 1884, torna-se desembargador do Tribunal de Relações de Goyaz, tendo trabalhado como Desembargador Procurador da Coroa, Soberania e Fazenda Nacional. Em 1889, com 68 anos, faleceu na Vila Boa de Goyaz, hoje cidade de Goiás.

Perfil e personalidade

Até o presente momento, não é possível estabelecer de forma precisa um perfil da sua atuação profissional ou da sua personalidade. Os jornais demonstraram isso claramente.

Eram parciais e distribuíam notícias e versões de interesse dos seus proprietários e dos partidos políticos aos quais estavam ligados. Alguns periódicos das províncias em que atuou tratavam-no como um magistrado exemplar, enquanto outros o acusavam de cometer abusos de autoridade, de conceder favores indevidos aos seus aliados ou de ser um juiz "venal".

É notório que sua trajetória profissional foi marcada por diversas controvérsias, o que pode ter causado mudanças de funções ou até mesmo a transferência de comarcas.

Características de sua atuação

O dr. Peixoto esteve em Macapá entre 1868 e 1870 e, sem dúvida, contribuiu para a jurisdicionalidade e a consolidação da comarca. 

Processo criminal de 1868 com a assinatura do dr. Francisco de Paula Lins dos
Guimarães Peixoto. Acervo do TJAP.

Foram identificados diversos processos judiciais assinados por ele. Além de magistrado, exercia a função de Delegado de Ensino. Cabe ressaltar que, em Macapá, o dr. Peixoto estava envolvido nas questões políticas criadas e ampliadas pelos aliados dos partidos Conservador e Liberal. Um desses eventos foi noticiado pelo jornal O Liberal do Pará no dia 17 de janeiro de 1869.

O jornal noticiava que o magistrado estava em viagem para Belém com o objetivo de se defender das acusações que lhe eram imputadas. O evento ocorreu no ano anterior e oferecia risco à vida do Capitão Fernando Álvares da Costa.

O Liberal do Pará, Anno I, Número 7, Belém do Pará, 17 jan. 1869, p. 1.

 Conta o relator anônimo do caso: O Dr. Peixoto, com um punhal em uma bengala, provocou o nosso amigo de uma forma inusitada e tentou feri-lo. após ter usado todos os meios para espancá-lo. Não tendo o dr. Peixoto procurado em lugar isolado e solitário, muito de propósito quis que a sua façanha fosse decantada por todos. Outros exemplos de questões políticas que envolvem o dr. Peixoto podem ser encontrados em periódicos da antiga província do Piauy.

Transferência para Goiás

O dr. Peixoto estava entre os magistrados mais antigos aptos a concorrer à vaga de desembargador no Tribunal de Relações de Belém. Mas, em 15 de novembro de 1884, foi nomeado desembargador do Tribunal de Relações de Goiás.

Em Vila Boa de Goiás (atual cidade de Goiás), aos 66 anos, ele se casou com Jacintha Luiza do Couto Brandão e, dessa união, nasceu Anna (Cora Coralina).

Relação pai x filha.

Imagem disponível em: Disponível em: <http://www.conhecendomuseus.com.br/noticias/dica-de-leitura-cora-coralina-em-8-obras-fantasticas/>

A poetisa não conviveu com seu pai, uma vez que ele faleceu dois meses depois dela nascer. No entanto, essa ausência parece ter deixado marcas profundas em sua vida. 

Imagem: Dr. Peixoto em foto póstuma. Museu Cora Coralina. Disponível em: <
https://www.got2globe.com/editorial/vida-obra-cora-coralina-escritora-margem/>

Isso fica evidente na fotografia póstuma do dr. Peixoto colocada na parede da casa velha da ponte (antes residência da família e hoje museu Cora Coralina) e nos seus versos, como no poema "Meu pai". 

Dr. Peixoto em foto póstuma: Imagem disponível em:
<https://areiaontemehoje.blogspot.com/2017/02/paternidade-areiense-da-poetisa-cora.html>

  • Meu Pai (In Memoriam)

Meu pai foi embora com suas vestes de Juiz. Eu nem sei quem o vestiu. Eu era tão pequeno, mal nascido. Ninguém previu que eu viveria.

Não coloquei nada em suas mãos. Nenhum beijo, nenhuma oração, nenhum suspiro triste. Eu era tão pequena... E fiquei uma criança minúscula na enorme ausência do meu pai que sentia falta.

Cora Coralina, inclusive, reformou o túmulo do pai,...

Túmulo de Desembargador Peixoto e da poetisa Cora Coralina. Foto Maria Elizia Borges. Disponível em:
<http://docplayer.com.br/113688367-Meu-adeus-a-vida-cora-coralina-1965.html>

 ...adquiriu um espaço ao lado e construiu, no local, o seu próprio túmulo.

Fonte: Assessoria de Comunicação Social 

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