quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Memória radiofônica: Orivaldo Santos "Galinho de Ouro" - Uma História de Superação

Passou agosto! Levou consigo nosso “Galinho de Ouro”. 
Há quinze dias, o competente e festejado radialista Orivaldo Santos foi chamado para o plano celeste. Ele partiu dia 29, três dias antes do florido e verdejante setembro, chegar. Foi um choque para todos. Embora soubéssemos que ele passava por delicado e preocupante estado de saúde, a notícia de morte, sempre surpreende e nos deixa incrédulos, num primeiro momento. Galinho viveu entre nós, superando barreiras e transpondo obstáculos que a vida lhe impôs. Mas sua vivência foi marcada por uma História de Superação, muito bem detalhada na narrativa de nosso contemporâneo jornalista José Machado:
IN MEMORIAM
ORIVALDO LEÃO DOS SANTOS, era natural de Chaves-Pa e veio ao mundo em 5/3/1955. O segundo de cinco irmãos, e o terceiro a falecer. Derivaldo e Edna Santos residem em Belém-Pa.
Aos sete anos, com o falecimento do pai - Amor Leão dos Santos, a viúva Catarina Monteiro dos Santos, enfrentou sérias dificuldades para criar cinco crianças pequenas.
Orivaldo, foi entregue ao padrinho, com quem conviveu até aos 17 anos de idade. Aos treze, tornou-se vendedor ambulante de pastéis e bolos, para contribuir com a rentabilidade familiar. A faina do garoto lourinho, iniciava às 9h da manhã quando deixava sua casa atravessava o dia e, nunca retornava antes das 17h quando já havia vendido tudo.
Após o almoço e um pequeno descanso seguia para o colégio onde cursava o supletivo. A exaustiva rotina era um desafio contra o cansaço, o sono e a vontade de desistir. Concluiu o ginásio com muito sacrifício e o segundo grau muitos anos depois.
Em uma certa manhã de suas caminhadas mercantis, entrou na Difusora e vendeu tudo rapidamente, encorajando-o a voltar diariamente e, foi se enturmando ao ponto de direcionar as vendas exclusivamente aos RDMistas para posterior pagamento.
Após zerar seus produtos, ficava horas na sala de áudio deslumbrado com os equipamentos e o desempenho do sonoplasta.Perguntava muito e ia assimilando as informações.
Um certo dia, sentindo que dois comensais queriam lesá-lo, após alguns impropérios, tirou o costumeiro boné do glorioso (Botafogo) e os desafiou para o embate físico.
Uma cena hilariante, de um infanto-juvenil franzino, queimado de sol em atitude agressiva com os punhos fechados em guarda contra dois brutamontes.
Como seria previsível, os dois pagaram e tudo terminou em risos. Era mais zoação, para testar o equilíbrio emocional do garoto.
Pela pose adotada de enfrentamento, Humberto Moreira, Pedro Silveira e José Machado, que presenciaram, expressaram uníssonos: “olha aí o galinho de ouro “. Numa alusão ao pugilista Eder Jofre,apelido que o acompanhou pela vida toda.
A partir daquele dia, sumiu por um certo tempo e quando reapareceu já adolescente, pleiteou uma oportunidade de estágio como operador.
A diretora da emissora à época, exercia paralelamente o magistério e, dessa forma José Machado que era o secretário, na prática era quem geria a rádio e foi quem lhe possibilitou o ingresso.
Um sonho profissional que procurou alcançar com obstinação.A oportunidade finalmente surgiu quando foi indicado para substituir EDUARDO SANTANA que pediu demissão para trabalhar nas Guianas.
Seu jeito introspectivo, calmo, fala pausada uma postura tranquila, disciplinado, sempre focado em fazer um bom trabalho, foi angariando simpatia, respeito e admiração de todos.
Era perceptível que se tratava de uma figura ímpar. Algum tempo depois, substituiu Humberto Moreira que pediu exoneração à chefia da discoteca.  
A dedicação em tempo integral, obrigou a deixar a sonoplastia temporariamente. Três servidores sob suas ordens o ajudavam em suas atividades.
O País em plena fase do regime militar, havia um grande controle da mídia e a Difusora mesmo estatal, era obrigada a encaminhar diariamente até as 17h a programação do dia seguinte.
Um calhamaço com trinta e cinco laudas contendo o título de 1065 músicas ao Departamento de Censura e Diversões Públicas da Polícia Federal. O descumprimento implicava em grave infração, caracterizando transgressão das normas vigentes, e a rádio estaria impedida de funcionar no outro dia.
Além do grande vexame moral para o Governo, prejuízo comercial (patrocinadores dos programas) a falta de compromisso social como ouvinte, muitas cabeças seriam decaptadas.
Era como o deadline (linha da morte) no jornalismo, em que o profissional precisa aprender a conviver com o prazo de entrega do seu trabalho.
A atividade do discotecário à época era muito exaustiva mental e emocionalmente e vivia-se em constantes apuros. Mas com o decorrer do tempo acabava acostumando-se.
Às sextas feiras eram os piores dias, considerando que sábado e domingo o DCDP não funcionava, as programações do fim de semana e mais a da segunda feira, teriam que ser entregues todas dentro do prazo acima mencionado.
Continuamente, colegas de outros setores iam em auxílio do “galinho”, para que pudesse cumprir com o compromisso e, livrar da guilhotina vários pescoços.
Mesmo enfrentando esse serviço extremamente estressante, Orivaldo Santos, foi o que mais tempo permaneceu na função...Dez longos anos.
Alguns anos de profissão e vasto conhecimento musical o levaram a buscar um novo desafio. Meados dos anos 80 se lançou como DJ com um programa independente em que apresentava diversas sonoridades.
O “TOCA TUDO” - passeava pelos mais variados estilos:rock, disco, samba-rock   pop, house, discothec, brega e ritmos caribenho em três horas de duração. Com uma comunicação coloquial, criou uma intimidade inédita com os ouvintes.
Mostrava um feeling apurado para discotecagem, tinha um bom gosto musical e uma técnica surpreendente. Deu mais opções ao ouvinte para agregar diversidade musical e conduzi-lo por vários estilos. Ganhou mais projeção, consolidou sua carreira artisticamente e provou ser eclético.
Mas como disse Guimarães Rosa  Viver é muito perigoso... Porque aprender a viver que é o viver mesmo”. É uma travessia com alegrias, tombos e tristezas.
Desposou a professora MARIA TEREZINHA, ambos muito jovens e, dessa relação nasceram: Marivaldo e Sandro. Enviuvou dez anos após o casamento.
Foi difícil a compreensão daquele novo momento em sua vida, viver uma nova realidade, lidando com a viuvez precoce foi um choque. Resolveu dar um tempo para relacionamentos, pensar com calma e, ter clareza na situação. Retomou gradualmente a vida, buscando suporte em amigos,familiares e a religião.
Em 2006, conheceu MARIA JOSÉ MARTINS FERNANDES DOS SANTOS, recepcionista e colega de serviço. Uma relação que perdurou 13 anos de casados, até que a morte os separou.
No museu da memória, se expõe as lembranças, a mitologia familiar de um personagem, cuja vida lhe foi hostil, interrompendo precocemente o sentido que não houve, como se desdobrasse para trás.
A vida/arte do “galinho” é um momento entre nós seus contemporâneos no espaço da vida, em que ele brilhou como emblema de uma época.
Para quem teve a oportunidade de acompanhar o seu percurso, há de convir que ele foi um vencedor, idealizou sua própria trajetória de vida. Seu círculo de amizades foi mensurado pelo grande público que compareceu para despedir-se e prestar-lhe a última homenagem.
ORIVALDO LEÃO DOS SANTOS (O GALINHO) conseguiu o milagre da vida...Escrever sua história, deixando sua biografia gravada no coração de muitas pessoas independente de idades.
Texto: José Machado
Foto: João Silva (Cortesia)
Orivaldo Leão dos Santos descansa em Paz, no Cemitério São José, no bairro Santa Rita.

Um comentário:

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